Opinião – Lugar ao sol

Quem não fala de política hoje em dia? Todo mundo fala (ainda bem!), mas vai se formando uma coleção de absurdos. Cansa, cansa ouvir que o presidente da República estimula práticas criminosas na Amazônia, escreve Luís Ernesto Lacombe

17/06/2022 06:58

”Como se os problemas da região tivessem começado no dia da posse de Bolsonaro”

O debate político atual pode ser resumido a “tudo é culpa de Jair Bolsonaro”. Foto: Alan Santos/Presidência da República

Houve uma época em que os brasileiros quase não falavam de política. Talvez por desesperança, talvez por falta de tempo, na luta diária de cada um por um lugar ao sol. Talvez não parecesse mesmo importante, não parecesse necessário que tivéssemos olhares atentos, senso crítico aguçado, informações reunidas, opiniões claras formadas sobre nossos governantes, seus mandos e desmandos. Talvez fosse preguiça, sensação de impotência, de que nada poderia ser melhorado. Todo poder emana do povo, mas lhe escapa rápido das mãos, dura o tempo de apertar os botões de uma urna eletrônica… Depois disso, somos todos reféns de votos equivocados, descolados do mundo real, definidos, muitas vezes, na ignorância do isolamento político, na cegueira, na ilusão, ou sob influência direta do oportunismo, do egoísmo.

Não queríamos saber de política, nos permitíamos a negligência, o desinteresse, o fato consumado: é assim, sempre foi assim e sempre será. Durante muito tempo, foi impossível pensar de modo diferente. Dois partidos parecidos se revezando no poder, no famoso “teatro das tesouras”, dois partidos de origens diferentes apontando para o mesmo destino: mais Estado. E é engraçado como o brasileiro tende a não gostar do governo, mas normalmente ama o Estado. É quase uma esquizofrenia daqueles que acreditam que existe alguma coisa de graça. Nada é de graça. Cada vez mais, as pessoas estão tendo essa compreensão… E por quê? Porque o Brasil se politizou, o que deveria ser maravilhoso.

Em que momento o debate político passa a ser inútil, desprezível, infrutífero? Em que momento deixa de ser debate e passa a gerar irritação, desconforto, danos à saúde?

Não vou aqui discorrer sobre o que nos levou a essa politização, há gente mais gabaritada do que eu para isso. A ideia é analisar brevemente o debate político… Tentar entender até que ponto ele sobrevive, é saudável, propositivo, indicador das melhores respostas, de caminhos. E em que momento passa a ser inútil, desprezível, infrutífero? Em que momento deixa de ser debate e passa a gerar irritação, desconforto, danos à saúde? Quando vira um bicho doido, veias saltadas, cara vermelha? Quando vira um engolidor de gente? Frases sobrepostas, vozes se escalando, leviandade, mentira, palavras se chocando no ar e se espatifando sem o menor sentido…

Quem não fala de política hoje em dia? Todo mundo fala (ainda bem!), mas vai se formando uma coleção de absurdos. Cansa, cansa ouvir que o presidente da República estimula práticas criminosas na Amazônia: garimpo, narcotráfico, grilagem, desmatamento… Como se os problemas da região tivessem começado no dia da posse de Bolsonaro. E, afinal, por que, em menos de quatro anos, ele já não solucionou todos eles? A milícia, o presidente é miliciano, mandou matar Marielle Franco, mandou dar sumiço em Bruno Pereira e Dom Phillips… Ataca diariamente a democracia. E se não fosse o STF para conter esses arroubos autoritários… Numa boa, isso é debate? Porque, desse jeito, não vamos a lugar algum.

 

Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos

 

Por Luís Ernesto Lacombe é jornalista e escritor. Por três anos, ficou perdido em faculdades como Estatística, Informática e Psicologia, e em cursos de extensão em administração e marketing. Não estava feliz. Resolveu dar uma guinada na vida e estudar jornalismo. Trabalha desde 1988 em TV, onde cobriu de guerras e eleições a desfiles de escola de samba e competições esportivas. Passou pela Band, Manchete, Globo, Globo News, Sport TV e atualmente está na Rede TV.