Fazer o círculo do setor produtivo voltar a girar deveria ser o foco do governo neste momento em que a pandemia, além de tornar a saúde um caso de calamidade pública, escreve Daniel José
27/06/2022 08:19
”O prato de comida do brasileiro está cada vez mais vazio”
Até chegar à mesa dos brasileiros, os alimentos da cesta básica podem atingir quase 38% de tributação, graças à sobreposição de impostos. Em um cenário de pandemia e aumento da inflação, que tornou a fome uma realidade ainda mais assustadora no país, este dado, divulgado pelo Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), basta para entender por que trabalhar por uma reforma tributária é tão urgente.
Hoje, mais de 33 milhões de pessoas se encontram em situação de insegurança alimentar grave, ou seja, passam fome no Brasil. Em pouco mais de um ano, de acordo com o 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19, 14 milhões de brasileiros passaram a não ter o que comer. Enquanto isso, o DIEESE registrou, em abril, a cesta básica mais cara da história do país: para comprar itens como arroz, feijão e macarrão, é preciso desembolsar, atualmente, mais de R$ 800 por mês. Segundo levantamento da entidade, o valor da cesta quase dobrou nos últimos seis anos, tornando a fome uma das maiores preocupações da população.
Recuperar a economia e o poder de compra do brasileiro devem ser prioridades absolutas do poder público. E uma tributação menos burocrática e mais justa é um ponto fundamental para isso. O sistema tributário brasileiro é um dos mais complexos do mundo. Isso acontece porque a Constituição de 1988 confere à União, estados e municípios o direito de instituir seus próprios impostos, sujeitando os produtos a uma danosa superposição de tributos.
A compra de um carro, por exemplo, está sujeita, ao mesmo tempo, às contribuições para o PIS e a Cofins, que incidem sobre as receitas; ao IPI, de competência da União, e ao ICMS, devido aos estados. Já com a atual crise dos combustíveis, quem consegue financiar um veículo é obrigado a arcar com o preço absurdo da gasolina, cujo valor é composto por 50% de impostos. Além de extremamente oneroso e complicado, nosso sistema tributário é totalmente sem sentido e a classificação fiscal é um retrato dessa bagunça.
Em meio a tanta complexidade, até o próprio Estado não sabe como tributar produtos que não se encaixam em uma só classificação. Isso dá margem a manobras como as da Lacta, que conseguiu alterar a classificação do bombom Sonho de Valsa de chocolate para wafer, zerando a cobrança de IPI. O mesmo ocorre com o calçado do tipo “crocs”, que fica entre sandália e chinelo.
Qual a razão de não facilitar a vida das empresas com uma tributação simplificada? Absolutamente nenhuma! Fazer o círculo do setor produtivo voltar a girar deveria ser o foco do governo neste momento em que a pandemia, além de tornar a saúde um caso de calamidade pública, vem afetando drasticamente o emprego e a renda do trabalhador brasileiro
No Congresso estão em discussão duas Propostas de Emenda à Constituição (PECs), a 45/2029 e a 110/2019, que têm em comum a extinção de tributos incidentes sobre bens e serviços. Além delas, há o Projeto de Lei 3.887/2020, que institui a Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços (CBS), unificando o PIS e a Cofins em uma só contribuição social. Esperamos, com a aprovação destas matérias, reduzir o custo de produção, aumentar a competitividade, o poder de consumo dos trabalhadores e gerar mais empregos, promovendo, assim, o retorno do crescimento da economia. O prato de comida do brasileiro está cada vez mais vazio. E adiar ainda mais a reforma tributária é condenar as pessoas à pobreza e à morte.
Por Daniel José é economista, mestre em Relações Internacionais e deputado estadual em São Paulo