Opinião – Meu voto foi “pesquisado”: empresas de pesquisa e o direito de votar

Cabe a nós retirar da nossa rotina aqueles que tentam nos influenciar de maneira parecida com os maus vendedores, e não deixar que as pesquisas direcionem nosso voto. Escreve Tiago Marian

12/10/2022 06:52

”Destaca-se de maneira gritante e irrefutável o quanto foram influentes as pesquisas nessas eleições. O erro ao qual fomos expostos não é novidade”

Imagem ilustrativa. Foto: Alejandro Zambrana/Secom/TSE

Influenciar, persuadir e sugerir são características muito louváveis e até requeridas para vendedores. Porém, mesmo entre profissionais das vendas, informações falsas são repudiadas, pois eles sabem que o cliente até pode até ser enganado uma vez, mas dificilmente voltará a confiar e decidir comprar novamente de um vendedor que mente. O mesmo vale para quem pretende levar informação para alguém, como as empresas de pesquisa.

Quando nos propomos a ser fonte de informação, devemos assumir a responsabilidade de sermos verdadeiros, já que, diferente de adquirir um carro, uma geladeira ou outro bem, certos dados são responsáveis por tomadas de decisão que afetam a vida de uma pessoa e quiçá a vida de uma nação.

Estamos atravessando um processo eleitoral majoritário que tem sofrido (talvez historicamente) o mais vil processo de desinformação já visto e um dos principais disseminadores desse desentendimento são aqueles que deveriam ser os mais insuspeitos dos dispositivos: os chamados institutos de pesquisa.

Entendo que “instituto” é uma intitulação que já traz a intenção de dissimular o que na realidade é uma empresa. No nosso imaginário, o termo “instituto” se refere a um órgão isento de opinião, isento de interesse, e de moral inquestionável. Quando lembramos que na realidade institutos de pesquisa são nada mais que empresas de pesquisa, começamos a perceber que há mais em jogo do que o simples interesse de revelar dados. Empresas visam lucros – e não há nada de errado com isso – e satisfação dos seus investidores – novamente, nada de errado nisso. Empresas precisam competir, buscar público e oferecer soluções para seus clientes.

O que devemos ter em mente é qual a natureza dos produtos oferecidos pelos institutos de pesquisa. Empresas (ou institutos) de pesquisa vendem, obviamente, pesquisas, ou seja, informações. Recentemente tivemos um candidato (velho de guerra) ao governo do estado do Paraná que, quando foi questionado por estar em segundo lugar nas pesquisas, declarou confiante: “Pesquisa, você sabe, a gente compra na empresa de pesquisa. Carne compra no açougue”, deixando claro que, assim como qualquer outro produto, você compra o que lhe satisfaz. Também tivemos o CEO de uma das maiores empresas de pesquisa do mercado atual, num provável ato falho, assumindo em rede nacional que há institutos que, “ao invés de vender pesquisa, vendem resultado de pesquisa”.

Temos de estar cientes disso. Quando somos bombardeados diariamente por essas “análises”, que acreditamos ter a ilibada missão de nos trazer fatos e dados para as nossas tomadas de decisões, somos impelidos a crer que estamos munidos de informações relevantes e verdadeiras e assim influenciados a usar esses resultados para embasar nossas atitudes.

Fato recente que corrobora com o dito até agora foi a eleição para senador no estado do Paraná. Tínhamos três candidatos em voga no pleito, sendo um já consagrado e monolítico representante da velha política, um promissor jurista, arraigado de inconsistências nas suas decisões, e um jovem político que vinha com o apoio da Presidência. Nas pesquisas divulgadas no dia anterior a eleição, o “monolítico” e o “jurista” despontavam ocupando as primeiras posições com 41% e 35% respectivamente e o “jovem político” vinha com pífios 14%.

Muitos – e me incluo nessa massa – que estavam insatisfeitos com a estagnação monolítica do atual senador paranaense, buscando uma renovação e apoiados nos dados divulgados, se viram com apenas duas opções: o “jurista” e o “jovem”. Qualquer um que olhasse para as pesquisas observava a mínima chance do terceiro colocado em vencer, portanto, decidiu-se pelo segundo colocado.

O dia do pleito chegou e qual a surpresa – não tão surpreendente assim? O dito terceiro colocado chegou ao final do pleito com quase 30% dos votos. Olhando para o resultado, totalmente incoerente com o que tinha sido exposto pelos institutos de pesquisa, cabe questionar quantos votos acabaram direcionados ao jurista por aqueles que acreditaram nos números apresentados e, por sua influência, acabaram deixando de votar em quem realmente queriam.

Destaca-se de maneira gritante e irrefutável o quanto foram influentes as pesquisas nessas eleições. O erro ao qual fomos expostos não é novidade. Vimos essas mesmas empresas cometerem erros repetidamente ao passar dos anos e nos perguntamos quando haverá responsabilização.

Infelizmente, a autoculpabilização de Dostoiévski não tem efetividade no mundo prático e nem vai dirimir as consequências dos erros. Teremos um senador que poderia não ter sido eleito e um povo que não tem seu representante legitimado. Tudo isso graças a uma total irresponsabilidade e falta de punibilidade dessas empresas de pesquisas e, principalmente (porque não), daqueles que as divulgam e continuam comprando esses produtos viciados e de baixa qualidade.

Cabe a nós retirar da nossa rotina aqueles que tentam nos influenciar de maneira parecida com os maus vendedores, e não deixar que as pesquisas direcionem nosso voto. E também cabe a nós exigir a devida apuração e até responsabilização de quem, através de pesquisas falsas, nos leva a uma determinada direção na hora de decidir em quem votar. Não podemos deixar que nos tirem os mais básicos direitos do Estado Democrático de Direito, que são a liberdade de opinião e o voto.

 

 

 

 

Por Tiago Marian é pequeno empresário e tem graduação em Administração de Empresas pela Universidade Tuiuti do Paraná.

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