A projeção do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, é de que em 2060 a população brasileira seja de 228,3 milhões, e mais, 25,5% deverá ter mais de 65 anos. Escreve Luciano Silva Martins
05/12/2022 06:33
“Nem a juventude sabe o que pode, nem a velhice pode o que sabe.” José Saramago
Extraída do primeiro romance de José Saramago publicado após o Nobel de Literatura no ano de 1998 (A Caverna), a frase, ora emprestada, talvez seja a expressão que melhor traduza o engajamento necessário no combate ao “etarismo”.
Usado pela primeira vez pelo médico americano Robert N. Butler o termo foi empregado para descrever a discriminação contra adultos mais velhos.
Como todo preconceito, o etarismo é multifacetado, mas eixo-central é a discriminação etária. No mercado de trabalho, por exemplo, o preconceito etário se insinua desde as dificuldades lançadas àqueles que buscam uma vaga de emprego até em eventuais preterições salariais.
Apesar de pouco conhecido no Brasil, o tema há muito é discutido em outras parte do mundo.
Nos Estados Unidos, desde a década de 60 houve significativos e relevantes avanços no combate à discriminação etária. Promulgada no ano de 1967, a “Age Discrimination in Employment Act” foi importante marco civilizatório que passou a proteger trabalhadores com idade acima dos 40 anos.
A União Europeia também já avançou as trincheiras incorporando legislações assecuratórias no âmbito profissional, respeitando o direito interno de cada país que compõe o bloco (diretiva do Conselho 2000/78/CE, de 27 de novembro de 2000 – https://apps.who.int/iris/handle/10665/340208).
No Brasil o tema é pouco debatido.
Segundo o Programa de Disseminação das Estatísticas do Trabalho (PDET), o estoque de trabalhadores empregados no mercado formal vem caindo desde 2014, passando de quase 50 milhões de empregos com carteira assinada existentes para pouco mais de 46 milhões em 2020.
Os flagelos que açoitam o mercado formal de trabalho é mais acentuado entre os mais jovens e entre o publico com mais de 50 anos de idade.
Pesquisa divulgada pelo InfoMoney e desenvolvida pela consultoria IDados, indicam que nos últimos 10 anos, o Brasil ultrapassou a marca de 2,2 milhões de desempregados nas duas extremidades, jovens e profissionais com mais de 50 anos. Ainda segundo a pesquisa, um em cada quatro profissionais com idade entre 18 e 24 anos está desocupado no Brasil.
Como explicar tal fenômeno na pirâmide etária?
Entre outras coisas, é o fato de que não há politicas públicas voltadas ao combate do preconceito etário no Brasil.
O país está em plena transformação demográfica. Entre 2012 e 2019, a população de idosos cresceu 19,5.
A projeção do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, é de que em 2060 a população brasileira seja de 228,3 milhões, e mais, um quarto da população (25,5%) deverá ter mais de 65 anos.
Não se trata apenas identificar disponibilidade de mão-de-obra entre os extremos etários, é questão de saúde pública. Trabalho é vida!
O médico brasileiro Alexandre Kalache (ex-diretor do Departamento de Envelhecimento e Saúde da Organização Mundial de Saúde), em entrevista ao blog do Centro de Estudos Estratégicos da Fiocruz, afirmou: “o ‘idadismo’ é uma das pragas do século 21”.
Segundo Alexandre, “saúde é criada no contexto do dia a dia: onde a pessoa mora, como se locomove, onde trabalha, como se diverte. São os determinantes sociais que condenam indivíduos a um envelhecimento precoce”.
A Organização Mundial da Saúde (OMS), demonstrou que estudo elaborado nos Estados Unidos da América no ano de 2020, apontou que atos discriminatórios por conta da idade ou de autopercepções elevou custos anuais em US$ 63 bilhões, para as oito condições de saúde mais caras, o equivalente a US$ 1 em cada US$ 7 (dólares americanos).
Além do que, não houve a transposição plena das fronteiras sanitárias impostas pela pandemia.
Diante deste cenário, resta-nos empreender esforços que possibilitem o equilíbrio da pirâmide etária, a elaboração e execução de políticas públicas sociais convergentes entre si, políticas sociais para além de seus limites temáticos, medidas que são prementes e, por isso mesmo, precisam ter a devida atenção do Poder Público, das empresas, organizações e da sociedade como um todo.
A dignidade social agradece.
Por Luciano Silva Martins é advogado.