O erro científico do Marxismo foi ignorar no cálculo da “mais valia” o quanto o trabalhador ganhava originalmente, e quanto ganharia trabalhando sob a produtividade de uma fábrica. Escreve Stephen Kanitz.
17/02/2023 06:43
“Não havia geladeiras, fogões, aquecedores, liquidificadores, lava-louças, ferro de passar roupas, aspiradores de pó, que as mulheres adorariam”
Vou descrever como começou a primeira fábrica capitalista, e quais foram os problemas de implantação.
Não dá para entender capitalismo sem começar do início.
Karl Marx pegou o bonde da industrialização andando, mas veja como o problema crucial é diferente.
Em 1733, John Kay inventou um tear manual mecânico, que aumentava em cinco vezes a produtividade de um tecelão.
Até então tecelões trabalhavam em casa, com um simples tear manual, vide foto, levava uma semana para fazer um metro.
John Kay construiu vinte teares semimecânicos ao longo de cinco anos, construiu um galpão e um refeitório, e aí saiu à cata de funcionários.
Sua primeira opção foi oferecer emprego justamente para quem já trabalhava em casa.
Estes ganhavam entre 60 e 100 shillings por mês, conforme os pedidos.
John Kay bate na porta de Bill Smith, e oferece 140 shillings por mês, faça sol faça chuva, eliminando a incerteza de renda que deixava os tecelões independentes aflitos.
Bill agradece, mas diz não, porque ele prezava sua liberdade.
“Eu quero ser dono de meu nariz, e não quero ter um patrão.”
John aumenta então a oferta para 200 shillings mais décimo terceiro salário e Bill, com restrições, aceita.
“Muito bem, segunda-feira você aparece no galpão, aqui está o endereço”, diz John Kay.
“Como? Eu vou ter que andar 16 km por dia? Nada feito.”
“Não vou perder duas horas por nada.”
John Kay aumenta então a oferta para 300 shillings que era possível justamente por causa do aumento de cinco vezes da produtividade.
Dos cinco, três ficariam com Bill, dois ficariam com John.
Bill aceita.
“Ótimo, então está contratado. Segunda-feira você começa. Seu horário será das 8h às 18h, seis dias por semana.”
“Horário? Nunca ouvi essa palavra?”, diz Bill.
“Como somos vinte pessoas em cooperação mútua, todos terão que chegar ao mesmo tempo e sair ao mesmo tempo, o que chamamos de horário”, responde Kay.
“Você terá que cumprir horário e terá que ser pontual”, diz John.
Daí surge a famosa pontualidade inglesa, e muita insatisfação para nós trabalhadores.
E a visão de Karl Marx que o capitalismo define a vida do trabalhador, vem dessa necessidade do horário.
Tanto que Bill recusa mais uma vez, e a primeira fábrica capitalista simplesmente não vingou.
Todos recusaram pela mesma razão.
O erro científico do Marxismo foi ignorar no cálculo da “mais valia” o quanto o trabalhador ganhava originalmente, e quanto ganharia trabalhando sob a produtividade de uma fábrica.
Marx e os marxistas não computam o ágio inicial para trabalhar numa fábrica exigido por Bill e todos os primeiros trabalhadores do capitalismo.
Pesou também na decisão do Bill, que não havia na época o que comprar com aquele dinheiro adicional.
Não havia geladeiras, fogões, aquecedores, liquidificadores, lava-louças, ferro de passar roupas, aspiradores de pó, que as mulheres adorariam.
Mesmo fenômeno ocorre hoje com a geração Z, que prefere ficar sem tudo isso, e aproveitar mais a vida como o Bill.
Ou seja, convencer trabalhadores a trabalhar fora de casa, cumprindo um horário rígido, demoraria muitos anos a ocorrer.
Quem possibilitou o capitalismo foram as mulheres, mas essa conto na próxima.
Por Stephen Charles Kanitz é um consultor de empresas e conferencista brasileiro, mestre em Administração de Empresas da Harvard Business School e bacharel em Contabilidade pela Universidade de São Paulo.