Opinião – Capacidade de observar: uma habilidade indispensável

Os olhos enxergam fisicamente os objetos e o mundo, mas somente a mente preparada é capaz de observar, analisar e extrair conclusões inteligentes. Escreve José Pio Martins.

10/10/2023 08:40

“Vale lembrar que nossa capacidade de observação depende de conhecermos as ferramentas que nos permitem fazer análises com conhecimento de causa”

Sherlock Holmes (à direita) e John Watson (à esquerda), em detalhe de ilustração de Sidney Paget. Foto: Sidney Paget/Domínio público/Wikimedia Commons

Em palestra que eu fazia sobre os desafios do mundo do trabalho, um estudante me perguntou qual é a principal habilidade capaz de aumentar o nível intelectual, melhorar a qualificação profissional e ampliar o conhecimento e cultura. Ele me pediu que escolhesse uma só habilidade como conselho aos jovens.

Respondi-lhe que, antes de tudo, é preciso ler, estudar e pesquisar durante seu processo de educação, para dominar os conteúdos que todos temos durante a educação básica. O mundo moderno atingiu um colossal estoque de conhecimentos científicos, teorias e tecnologias, como também cresceram muito os meios e fontes disponíveis para a busca de informação.

Na resposta que dei, afirmei que há uma habilidade de natureza instrumental altamente útil e capaz de elevar nossos conhecimentos gerais e a competência na solução de problemas e execução de tarefas. Essa habilidade é a capacidade de observação. Mas não é qualquer observação.

Duas pessoas podem observar o mesmo objeto ou evento, durante o mesmo tempo. A primeira é capaz de relatar vários aspectos do objeto, fazer boas comparações, estabelecer conexões com outras ciências e aspectos da vida para, ao fim, extrair análise inteligente, com base técnica, histórica e científica. A segunda pessoa, embora tenha olhado o objeto durante o mesmo tempo, revela-se incapaz de fazer qualquer análise inteligente e, no máximo, tira algumas conclusões triviais e pobres de conteúdo. Aqui começa a diferença entre os dois observadores.

Sherlock Holmes, o famoso detetive das obras de ficção do escritor Conan Dolye, foi perguntado sobre qual era seu método para ter tanto sucesso em desvendar crimes complexos. Conan Doyle era médico e filósofo, falecido em 1930, e se revelou um gênio da literatura e das obras de ficção. Sobre a pergunta, Sherlock respondeu: “Meu método se baseia na observação de detalhes triviais que escapam aos olhos dos leigos. O mundo está cheio de coisas óbvias que por acaso jamais serão observadas. Muitas pessoas enxergam, mas não observam”, disse ele.

Eu disse ao aluno: “Sherlock respondeu por mim, há mais de 100 anos”. Há pessoas que viajam pelo mundo a negócios ou turismo, mas, quando perguntadas sobre qual avaliação fazem dos países que visitaram quanto a sua política, sua economia, história e aspectos sociais, a resposta é quase nada. Ou seja, a pessoa visitou vários lugares, olhou muito, tudo superficialmente, e não enxergou nada além das imagens que os olhos alcançam.

Parafraseando Antoine de Saint-Exupéry (1900-1944), autor de O Pequeno Príncipe, o essencial é invisível aos olhos; o essencial só é visível com a mente. Os olhos enxergam fisicamente os objetos e o mundo, mas somente a mente preparada é capaz de observar, analisar e extrair conclusões inteligentes.

Porém, convém lembrar que essa lógica de ver, observar, captar, analisar e concluir aplica-se a todos os setores da vida. Seja na família, na sociedade, no trabalho e nas várias interações humanas, o observador preparado e atento tem mais chance de vencer na vida pessoal, profissional ou social.

Vale lembrar que nossa capacidade de observação depende de conhecermos as ferramentas que nos permitem fazer análises com conhecimento de causa. Essas ferramentas são: dominar o idioma, conhecer matemática, raciocínio lógico e pensamento analítico e, também, adotar o hábito de observar atentamente, prestando atenção a detalhes. Na filosofia grega, Parmênides e posteriormente Platão explicaram a diferença entre duas palavras: doxa e episteme. Doxa é opinião. Episteme é conhecimento. Doxa é a opinião do povo, enquanto episteme é a opinião dos especialistas e cientistas derivada de estudo e pesquisa com uso de método técnico e científico.

 

 

 

 

Por José Pio Martins é economista e professor de Macroeconomia, Microeconomia, Finanças Empresariais e Filosofia, em cursos de graduação e pós-graduação. Foi secretário do Planejamento de Londrina, diretor-geral da Secretaria da Fazenda do Paraná, vice-presidente do Banco do Estado do Paraná e reitor da Universidade Positivo.

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