Opinião – Tribos modernas

Acrescente-se que estes círculos fechados se consideram suficientemente informados a ponto desprezar os meios tradicionais de divulgação de notícias. Escreve Renato Gomes Nery.

11/12/2023 06:06

“O Lula não era um socialista, mas sim um convicto trabalhista”

Imagem reprodução/divulgação.

Quando o Fernando Henrique disputava com o Lula a Presidência da República em 1994 e 1998 quase não existiam a direita radical ou a esquerda fanática.

O Lula, que pode ser considerado o representante desta última tendência, não era um socialista, mas sim um convicto trabalhista que se formou nas fábricas automotivas do ABC paulista. Seu opositor, o Fernando Henrique, se dizia social democrata.

Entre os demais concorrentes nesses pleitos destacava-se o Orestes Quércia do PMDB, que apresentava uma posição de centro ou centro-direita como é da índole do seu partido. Outro candidato, o Enéas Carneiro – fez uma campanha folclórica com suas românticas ideias nacionalistas, alardeando que a exploração do nióbio poderia salvar a economia do País.

Teve ainda o Leonel Brizola que já estava em fim de carreira e vivia repetindo exaustivamente que o problema do Brasil eram as “perdas internacionais.” Este talvez tenha sido o mais próximo da esquerda no espectro político do Brasil. Além desses havia o Ciro Gomes que passou por diversos partidos e, apesar da idade, continua o mesmo destemperado de sempre.

Bons tempos esses que os partidos e os eleitores só tinham rivalidades políticas não afetivas. Ou seja, estavam ideologicamente em campos opostos, mas não se odiavam.

Mas eis que em 2002, depois de três derrotas consecutivas, o Lula – disputando outra vez com o PSDB, desta vez representado pelo José Serra – vence a eleição já no primeiro turno. Nas três eleições seguintes o PT continua vitorioso, superando nos votos o Geraldo Alckmin, o José Serra (outra vez) e o Aécio Neves.

Mas o PT não soube lidar com o sucesso e lambuzou-se com o melado que não sabia comer. Descoberto pela operação Lava-Jato, foi punido e abriu caminho para a extrema-direita assumir o poder. Mas esta, pela sua inépcia, perdeu o comando do país e a esquerda voltou.

Mas, por que razão em tão pouco tempo o Brasil foi dividido em duas tribos inimigas que se odeiam mutuamente? É certo que o começo das hostilidades deve ser imputado ao Lula e ao Bolsonaro, mas me parece que estes dois, ou quaisquer outros, não teriam força suficiente para fazer a divisão se não houvesse acontecido um fenômeno inaudito: as redes sociais.

Elas permitiram a reprodução moderna das tribos antigas que habitavam um espaço comum, onde cultivavam crenças e costumes mantendo-se refratárias a influências de outros agrupamentos. Os grupos de WhatsApp de esquerda ou de direita são como estas tribos, pois pensam politicamente da mesma forma e estão vacinados contra qualquer ideia discordante.

Acrescente-se que estes círculos fechados se consideram suficientemente informados a ponto desprezar os meios tradicionais de divulgação de notícias, quais sejam jornais, revistas, televisão ou rádio. Essas mídias são consideram tendenciosas, mal-intencionadas ou “vendidas”.

Para eles bastam os posts fantasiosos que circulam nos grupos.

 

 

 

 

 

Por Renato de Paiva Pereira é empresário.

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