É fundamental debatermos a necessidade de contratação e qualificação de novos servidores e requalificação dos servidores já lotados. Escreve Larry Carvalho.
04/01/2024 08:40
“Somente assim teremos uma mudança do status quo”
Muito tem se noticiado nessas duas últimas semanas sobre a greve dos auditores da RFB para reivindicar a implementação do bônus de produtividade. O debate com o governo tem sido acirrado e a AGU já afirma que a greve poderá afetar a meta fiscal. Do outro lado da mesa, os contribuintes têm sofrido prejuízos com atrasos no despacho aduaneiro. E, enquanto o foco do debate persiste sob o prisma remuneratório, existe um grande elefante branco na sala que ninguém aborda: o esvaziamento da RFB.,33,
Em 2020, a Associação dos Auditores divulgou que o órgão já tem mais de 21 mil cargos vagos. Entre 2010 e 2022, os números de servidores nas fronteiras caíram 130%. Para ter ideia, em 21 dos 32 pontos aduaneiros de nossa fronteira, não havia mão de obra lotada para o desenvolvimento de atividades essenciais ao controle aduaneiro. Do ano de 2009 até 2021 o número de servidores caiu de 12.721 para 7.733, sendo que desse total 1.503 já estavam recebendo o abono-permanência, um benefício para quem preencheu os requisitos para a aposentadoria e permanece na ativa. Esses números são um verdadeiro raio-X da situação das nossas alfândegas.
Em virtude da escassez de mão de obra, a Receita Federal do Brasil apostou na criação e utilização de sistemas com inteligência artificial para aumentar a produtividade de seus servidores e conseguir garantir o controle aduaneiro mesmo com as alfândegas esvaziadas. O problema é que os sistemas ainda possuem muitas falhas além de não terem a experiência humana. Fato que tem, por muitas vezes, embaraçado e dificultado o despacho aduaneiro. E o pior, empresas não possuem acesso e sequer sabem o que tem feito o “Big Data” a aumentar o seu grau de risco aduaneiro.
O último balanço aduaneiro, inclusive, demonstrou uma redução dos números de apreensão em virtude de maior parametrização e fiscalizações aleatórias pelo sistema, sem maior análise de risco, o que resultou em muitas fiscalizações improdutivas. Por conta dos números reduzidos de servidores, sentiu-se um impacto direto nas apreensões do ano. Por outro lado, os auditores também sofrem com maior carga de trabalho por causa do esvaziamento. Nossas fronteiras ficam desguarnecidas e o Brasil tem aparecido nas manchetes nacionais e internacionais, pois nossos portos têm servido de hub para a exportação de drogas.
Portanto, é essencial que se inicie o debate quanto ao aumento dos quadros de servidores lotados nas alfândegas, somente assim teremos uma fiscalização menos dependente da utilização de sistemas. Não podemos e nem devemos persistir nesse erro histórico de queda de braço de negociação com aspecto meramente remuneratório ou de produtividade. É fundamental debatermos a necessidade de contratação e qualificação de novos servidores e requalificação dos servidores já lotados. Somente assim teremos uma mudança do status quo.
Por Larry Carvalho é advogado, mestre em Direito Marítimo e especialista em logística, comércio internacional e agronegócio.