A Maldição do Vencedor não se limita a prejudicar o contratado, mas afeta diretamente a sociedade, que paga pelos erros do sistema sem obter os benefícios esperados. Escreve Eduardo Capobianco.
20/03/2025 05:55
“É necessário repensar com urgência o uso dos leilões nas licitações de obras e serviços.”

Ilustrativa.
O uso de leilões nas licitações de obras públicas tem causado polêmica quanto aos efeitos adversos que pode provocar. Estudos mostram que o modelo pode resultar em grande envolvimento emocional por parte dos participantes, afetando a tomada de decisão e gerando contratos desfavoráveis. Tal fenômeno é conhecido no mercado como a Maldição do Vencedor.
Quando o processo envolve a compra de um bem, a disputa leva a um aumento de preço que beneficia o vendedor, mas sem consequências graves. No entanto, no caso de obras e serviços para entrega futura, o impacto é muito maior, pois o vencedor acaba assumindo um compromisso financeiro em um maior prazo, que não cobre o custo real da execução do projeto, prejudicando todos os envolvidos, especialmente a sociedade.
No Governo Dilma Rousseff, houve um volume expressivo de concessões públicas baseadas em leilões, mas muitas revelaram-se inviáveis. Ocorreram várias renúncias contratuais após longos processos administrativos e judiciais. O modelo falhou ao não garantir que os termos acordados fossem financeiramente sustentáveis.
Para as concessões, a solução foi mais simples: manteve-se uma redução limitada para as tarifas cobradas pelo concessionário, garantindo a viabilidade dos projetos a longo prazo. Além disso, a disputa passou a ser sobre o valor da outorga e não apenas referente à redução do preço. Com isso, mesmo valores elevados pagos na assinatura do contrato não inviabilizaram a concretização e desenvolvimento dos compromissos acordados, permitindo a manutenção da necessária sustentabilidade financeira.
No entanto, essa alternativa não pode ser aplicada às obras públicas. Nessas licitações, nas quais o critério principal é o preço mais baixo, muitos contratos acabam sendo prejudicados pela insuficiência dos recursos destinados à execução dos projetos. Com a impossibilidade de ajustar tarifas ou reequilibrar os custos ao longo do tempo, os empreendimentos frequentemente são paralisados, gerando grande desperdício de recursos do erário. Há, ainda, o risco de se comprometer a qualidade dos serviços prestados.
No cenário político brasileiro, as obras paralisadas não costumam gerar pressão significativa para sua conclusão. Os governantes tendem a se preocupar mais com o marketing no lançamento de projetos e na celebração das contratações do que com a entrega. Sem falar de quando um gestor não conclui a obra do antecessor, por ser seu adversário político. Como resultado, os cidadãos não veem os benefícios dos investimentos feitos e são apenados com a perda de um dinheiro que poderia ser mais bem aplicado. O problema abala a confiança da sociedade nos investimentos em infraestrutura e agrava o desequilíbrio fiscal.
Portanto, é necessário repensar com urgência o uso dos leilões nas licitações de obras e serviços. A opção é buscar modelos que assegurem a viabilidade financeira e a execução efetiva dos projetos, sem comprometer o interesse público. A Maldição do Vencedor, nesse contexto, não se limita a prejudicar o contratado, mas afeta diretamente a sociedade, que paga pelos erros do sistema sem obter os benefícios esperados.
Por Eduardo Capobianco é CEO do Grupo Agis, vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP) e presidente do CONSIC (Conselho Superior da Indústria da Construção da FIESP).