É fundamental ampliar programas de segurança alimentar para proteger as famílias mais vulneráveis. Escreve Hugo Garbe.
20/03/2025 11:35
“Até quando os brasileiros terão que lidar com esse peso no bolso sem uma resposta efetiva?”

Foto: Marcelo Andrade
Nos últimos meses, quem vai ao supermercado tem sentido no bolso um impacto que vai muito além da inflação oficial. Alimentos básicos, que sempre foram considerados acessíveis, como o ovo, estão cada vez mais caros. Para milhões de brasileiros, esse aumento não é apenas um número nas estatísticas econômicas, mas uma realidade que pesa no orçamento do dia a dia.
Se antes o ovo era visto como uma alternativa barata à carne, agora ele próprio se tornou um item caro. O que está por trás dessa alta e até que ponto ela pode afetar a segurança alimentar da população?
A resposta para essa pergunta passa por uma combinação de fatores que se retroalimentam. O primeiro e mais evidente é o aumento do custo da ração animal. As galinhas poedeiras se alimentam, principalmente, de milho e farelo de soja – duas commodities que têm seus preços atrelados ao mercado internacional. Com eventos climáticos extremos afetando as safras e a alta do dólar encarecendo a importação de insumos, o custo de produção subiu.
Outro fator importante é a pressão logística. O preço dos combustíveis aumentou nos últimos anos, impactando o transporte dos alimentos do campo até os centros urbanos. Além disso, a energia elétrica usada na produção e refrigeração também ficou mais cara, elevando os custos operacionais para os produtores.
E como se isso não bastasse, há ainda a questão da demanda. Com o preço da carne bovina e do frango em patamares elevados, muita gente passou a consumir mais ovos como fonte de proteína, aumentando a procura e pressionando os preços para cima.
Para as famílias de menor renda, que já destinam uma parcela significativa do orçamento para a alimentação, essa alta tem sido especialmente cruel. O preço dos alimentos subiu mais do que a renda da maioria dos brasileiros, tornando a cesta básica cada vez mais inacessível.
A consequência imediata disso é a mudança nos hábitos alimentares. Quando os preços dos alimentos aumentam, as famílias tendem a reduzir o consumo de itens mais nutritivos e diversificados, optando por produtos ultraprocessados, que muitas vezes são mais baratos, mas também menos saudáveis.
Além disso, a alta nos preços dos alimentos gera um efeito em cascata na economia. Quando uma parte maior da renda precisa ser destinada à alimentação, sobra menos dinheiro para outros gastos, o que pode desacelerar o consumo em outros setores e afetar o crescimento econômico como um todo.
Não há uma resposta simples para conter a alta dos preços dos alimentos, mas algumas medidas podem ajudar. O fortalecimento da produção nacional de grãos, por exemplo, pode reduzir a dependência do Brasil em relação ao mercado externo e diminuir a vulnerabilidade dos preços às flutuações internacionais.
Outra alternativa é a desoneração de tributos sobre os alimentos básicos. No Brasil, a carga tributária sobre alimentos é relativamente alta, e uma política de redução temporária de impostos pode ajudar a aliviar os preços no curto prazo.
Por fim, é fundamental ampliar programas de segurança alimentar para proteger as famílias mais vulneráveis. Políticas públicas que garantam acesso a alimentos nutritivos a preços acessíveis são essenciais para evitar que a alta de preços se transforme em um problema de saúde pública.
A alta no preço dos ovos e de outros alimentos essenciais reflete um problema maior: a dificuldade de milhões de brasileiros em garantir uma alimentação de qualidade diante da perda do poder de compra. Se nada for feito, essa pressão no orçamento das famílias pode levar a um quadro ainda mais grave de insegurança alimentar no país.
A questão que fica é: até quando os brasileiros terão que lidar com esse peso no bolso sem uma resposta efetiva? O debate sobre os preços dos alimentos precisa ser prioridade na agenda econômica, pois afeta diretamente a qualidade de vida da população e a estabilidade do país como um todo.
Por Hugo Garbe, docente de Ciências Econômicas da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM)