Opinião – Anistia não é “passar pano”, mas resgatar a Justiça

O Judiciário precisa de retomar o seu papel de poder julgador com mais imparcialidade e parar de legislar mediante a usurpação das atribuições do Congresso Nacional. Escreve Marcio Pacheco.

06/04/2025 06:26

“Não é ignorar excessos. É exigir coerência. É pedir proporcionalidade”

Manifestantes homenageiam Cleriston Pereira da Cunha, de 46 anos, o Clezão, preso do 8/1 que morreu em novembro de 2023, por um mal súbito, no Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília (Foto: Bruno Sznajderman)

O que estamos vivendo não é apenas um debate sobre anistia. É um teste – um teste da memória, da coerência… e da Justiça. Porque, vejam só: em 2013, milhares de pessoas tomaram as ruas do país. Brasília foi palco de cenas intensas. Manifestantes subiram na marquise do Congresso, quebraram vidraças do Itamaraty, incendiaram objetos, enfrentaram a polícia. Um levante popular, disseram. Uma juventude vibrante, exaltaram.

Após o impeachment de Dilma, em 2017, de novo, o chão de Brasília tremeu. Era o governo reformista de Temer e a manifestação “Ocupa Brasília”, convocada por centrais sindicais, partidos de esquerda e movimentos sociais cobriu a Praça dos Três Poderes com o vermelho de suas bandeiras. Foram 45 mil pessoas. Depredação e incêndio em ministérios – dentre eles o do Trabalho e da Agricultura. Tentativa de invasão ao Palácio do Planalto que teve as Vidraças quebradas. Depredações generalizadas. O governo precisou autorizar o uso das Forças Armadas para conter o caos.

Agora respire fundo e tente se lembrar: quantas vezes você viu o STF se pronunciar com a mesma veemência que vimos em 2023? Quantos foram os presos desses outros eventos que também promoveram grande ataques e destruição de bens públicos em 2013 e 2017? E quais foram as penas?Eu digo: poucos. Pouquíssimos. E mais: ninguém falou em “terrorismo”. Ninguém pediu inquérito por “organização criminosa”. Ninguém clamou por anos de prisão.

E por quê? Porque os protagonistas eram outros. Eram os movimentos “certos”. Os aliados “certos”. Aqueles que, hoje, ocupam cargos, palanques e palácios. Mas em 2023, quando os manifestantes – por mais que tenham ultrapassado limites – tinham outro perfil ideológico, aí sim… o tom mudou. Todos que estavam presentes foram – e estão sendo – perseguidos; passaram a ser chamados de “bárbaros”, “selvagens”, “terroristas”. Muitos sem sequer terem participado dos atos de vandalismo.

Em menos de 48 horas, mais de 1500 pessoas, independentemente das intenções ou ações, foram presas e mantidas presas, em condições subumanas; Alguns detidos dentro de ônibus, outros com idade avançada, problemas de saúde – como o caso do autista que ganhava a vida como coletor de recicláveis e passou seis meses preso na Papuda – ou sequer sabiam o que estava acontecendo. Foram processados, e estão sendo julgados e condenados a penas cruelmente severas e sem precedentes.

Homens, mulheres, idosos, patriotas – tratados como bandidos de guerra. O STF… ah, o STF. Esse mesmo que, em 2013 e 2017, silenciou diante da baderna, hoje comanda uma cruzada judicial sem precedentes. É disso que se trata esta luta pela anistia. Não é passar pano. Não é ignorar excessos. É exigir coerência. É pedir proporcionalidade… “Dosimetria” como disse o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, em entrevista para o Roda Viva. É resgatar o que o Estado esqueceu: a Justiça deve ser cega – e não seletiva.

Quem depredou, deve responder; e, com o pleno respeito ao devido processo legal e as garantias constitucionais de ampla defesa, deve, como todo cidadão, receber as devidas consequências previstas em lei. Mas quem foi arrastado por generalização, por conveniência ou por vingança política… precisa de um gesto de equilíbrio.

Se os gritos de 2013 e 2017 foram considerados legítimos; se as pedras jogadas por sindicatos foram chamadas de protesto, por que os de 2023 merecem o cárcere e o esquecimento? Não é apenas por eles que pedimos anistia. É por todos nós! É pela democracia, que não pode ter lado. É pela história, que não podemos admitir que seja escrita por trapaceiros.

Antes de ir, registro dúvidas históricas. Os mais de 39 mil pedidos de anistia deferidos em 1979 eram justos? As campanhas pela soltura de esquerdistas eram realmente legítimas? Lembrando que aqueles, sim, cometeram, objetivamente, crimes hediondos como assassinatos, roubos e sequestros. Coincidência ou dicotomia que os gritos de “sem anistia” partam exatamente dos que defendiam “ampla, geral e irrestrita” volta dos exilados políticos?

Quando eu sei, eu conto. Quando não sei, pergunto. E, enquanto posso, opino: o Brasil precisa, urgentemente, de ser “desavermelhado”, desaparelhado e liberto das narrativas esquerdistas e das doutrinações alienantes, que cegam até pessoas aparentemente esclarecidas, detentoras de poder e formadoras de opinião.

O Poder Judiciário precisa de retomar o seu papel de poder julgador com mais imparcialidade, despolitização, “desideologização”, fundamentado nos princípios do Direito Romano; e parar de legislar mediante a usurpação das atribuições do Congresso Nacional. E o Congresso Nacional? Ah, o Congresso Nacional vou deixar para você exercitar o raciocínio e emitir a tua opinião sobre a postura e protagonismo nesse momento da história…

 

 

 

Por Marcio Pacheco, deputado estadual, policial federal, presidente da Comissão de Finanças e Tributação, integrante da Comissão de Constituição e Justiça e da Comissão de Segurança Pública da Assembleia Legislativa do Paraná (ALEP).

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