15/12/2015 12:59
Segundo analistas, alguns motivos podem explicar o esvaziamento dos protestos favoráveis ao impeachment de Dilma Rousseff, que tiveram a menor adesão entre todas as manifestações que pediam a saída da presidente
Para o cientista político Ricardo Costa de Oliveira, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), o desconforto com Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados, seria um dos fatores preponderantes. “A rejeição a ele é ainda maior do que a de Dilma. O fato de ele ser o principal articulador do processo teve impacto negativo na adesão”.
Carlos Melo, professor do Instituto de Pesquisa e Ensino de São Paulo (Insper), também aposta no ‘Fator Cunha’, ressaltando que os motivos para o impedimento da presidente ainda não estão claros. “Os motivos para o impeachment são outros, o que se convencionou chamar de pedaladas fiscais – e as pessoas não sabem o que é isso”, afirma. Ele também crê que os problemas econômicos serão sentidos com mais intensidade depois do fim do ano, o que poderá dar maior adesão aos próximos protestos.
Da Deutsche Welle
Os doferentes motivos para baixa adesão aos protestos
Manifestantes que pedem a saída da presidente Dilma Rousseff voltaram às ruas de algumas principais cidades brasileiras no domingo (13/12). A expectativa antes das manifestações era grande, já que se tratava da primeira convocação após o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), dar início ao processo de impeachment contra a presidente, mas a adesão conseguiu ser menor do que nos três grandes protestos que ocorreram em março, abril e agosto, quando a possibilidade de impeachment ainda estava distante.
Na Avenida Paulista, em São Paulo, o principal termômetro das manifestações, 40 mil pessoas compareceram para protestar, segundo o instituto Datafolha. É um número bem inferior ao pico de 210 mil em março, e abaixo de abril (100 mil) e agosto (135 mil). Outras cidades, como Rio de Janeiro, Brasília e Curitiba, também registraram manifestações menores que as anteriores.
Segundo Kim Kataguiri, um dos líderes do Movimento Brasil Livre (MBL) – um dos principais grupos por trás das manifestações –, os números não representam um esvaziamento dos protestos. “Ficamos surpresos que tanta gente tenha resolvido comparecer. Convocamos os protestos deste domingo com poucas semanas de antecedência. A organização foi menor, mas mesmo assim milhares de pessoas apareceram”, afirma.
Após a divulgação dos primeiros números, o Planalto evitou comemorar a baixa adesão. O ministro da Secretaria de Comunicação Social (Secom), Edinho Silva, comentou apenas que as “manifestações são normais em um regime democrático”.
Outros membros do PT apontaram que o esvaziamento ocorreu por causa da falta de credibilidade de Cunha para conduzir o processo de impeachment. O senador Lindbergh Farias (PT-RJ), que liderou o movimento dos caras-pintadas contra o então presidente Fernando Collor, em 1992, considerou as manifestações “fracas”.
“Depois do pedido de abertura do impeachment, seria o momento de crescimento para as manifestações, mas muita gente que não gosta da Dilma está achando que é um movimento que surge de um gesto de chantagem do Eduardo Cunha. As pessoas perceberam que a oposição não está pensando no Brasil”, disse o senador.
Alívio temporário para o Planalto
Especialistas ouvidos pela DW apontam que o entusiasmo com as manifestações deste domingo foi evidentemente menor do que nas anteriores, mas discordam sobre os motivos do esvaziamento.
O cientista político Ricardo Costa de Oliveira, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), aponta que o fator Cunha foi a principal explicação para a baixa adesão. “A rejeição a ele é ainda maior do que a de Dilma. O fato de ele ser o principal articulador do processo teve impacto negativo na adesão. As pessoas também estão começando a pensar sobre o papel da oposição e do vice-presidente Michel Temer. Elas estão pensando se estão sendo usadas na busca deles pelo poder”, afirma.
“É claro que os números são menores, e o desânimo de muitas pessoas era nítido. Ainda existe um descompasso entre as principais forças que combinadas podem levar a saída de um presidente: as ruas, a Justiça e a classe política. Em março, eram as ruas que pediam a saída, enquanto os políticos e a Justiça estavam longe de concluir pela derrubada do governo. Agora, as ruas estão mais esvaziadas, enquanto o processo de saída está analisado pela Justiça, e os políticos estão se organizando e falando abertamente a favor do impeachment. Ainda assim, as ruas podem voltar a se combinar e pressionar ainda mais as outras duas forças. As manifestações podem estar pausadas, mas Dilma continua fragilizada”, afirma Rodrigo Prando, da Mackenzie.
Já Ricardo Ismael, da PUC-Rio, afirma ainda que mesmo com uma baixa nos números, os manifestantes ainda exibem capacidade de sustentar o movimento.
“A comparação entre números é um pouco enganosa. Esses grupos conseguiram sustentar um movimento que nasceu em março e que em dezembro ainda é capaz de colocar milhares de pessoas nas ruas – e tudo isso sem o mesmo nível de apoio e organização de movimentos sociais tradicionais ligados ao governo. Isso é uma façanha. Os organizadores só contam com redes sociais para convocar os manifestantes”, afirma.
Ainda segundo Ismael, as manifestações têm mais possibilidade de ganhar força conforme o processo contra Dilma Rousseff avançar.
“Antes, os manifestantes já conseguiam convocar milhares quando o processo de impeachment era só uma especulação. Agora, com um ‘calendário de impeachment’ finalmente se desenhado, as manifestações têm mais potencial. É possível dizer que eles não esperavam que o processo contra Dilma fosse ainda aberto neste ano. Isso pode explicar a adesão menor. Nenhuma manifestação chega ao ápice enquanto o processo está longe de ser completado”, opina.
O professor Oliveira, da UFPR, discorda. “As ruas falharam com os promotores do impeachment. Dificilmente elas vão desempenhar um papel determinante”, afirma.
Novos protestos
Os movimentos contra o governo já decidiram a data do próximo protesto: 13 de março de 2016, logo após o fim do recesso parlamentar. “Avaliamos os protestos deste domingo como um ‘aquecimento’ para a próxima grande manifestação que estamos convocando”, afirma Kim Kataguiri.
O calendário fixado pelos manifestantes está em compasso com os planos da oposição, que se organiza para que o processo todo de impeachment só comece a ser analisado a partir do fim de fevereiro, com o objetivo de deixar o governo “sangrar” ainda mais até lá e apostando que o quadro econômico se deteriore.
Já o governo Dilma Rousseff trabalha para que o Congresso cancele o recesso e convoque sessões extraordinárias para analisar medidas de ajuste fiscal e o processo de impeachment entre janeiro e fevereiro.
Da BBC Brasil
Para analistas, desconforto com Cunha esvaziou protestos contra Dilma
Manifestações em 22 Estados e no Distrito Federal marcaram, no domingo, a primeira jornada de protestos contra o governo após o acolhimento do pedido de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff pelo presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha.
O público, entretanto, foi bem menor do que nas três mobilizações anteriores realizadas neste ano pedindo a saída de Dilma.
No protesto em Brasília, por exemplo, a Polícia Militar estimou a presença de 6 mil pessoas. Em agosto passado, foram 25 mil. O mesmo ocorreu em São Paulo, onde 30 mil manifestantes estiveram na Avenida Paulista neste domingo, dez vezes menos do que há quatro meses, quando eram 350 mil.
Mas o que isso significa para o governo do presidente Dilma Rousseff e para a oposição? Estes protestos terão algum efeito sobre o processo de impeachment? E eles podem voltar a crescer?
Para responder a estas questões, a BBC Brasil colheu os depoimentos de três cientistas políticos.
Carlos Melo, professor do Instituto de Pesquisa e Ensino de São Paulo (Insper)
“A presença foi bem pequena. Contribuiu para isso o fato da escolha da data ter sido péssima. Quem vai para a rua em 13 de dezembro (data da decretação do AI5 pela ditadura militar) tem um viés autoritário ou é desinformado. Quem tem uma cultura democrática mínima fica reticente. Mas não acho que isso tenha sido decisivo.
Mais importante é o fato do impeachment ainda estar sendo confundido com uma disputa entre Cunha e Dilma. As pessoas se perguntam se ir para a rua contra Dilma agora vai sinalizar que são a favor do Cunha. Talvez um protesto contra o Cunha conseguisse maior mobilização neste momento, porque seus problemas estão mais em evidência.
Os motivos do impeachment também ainda não estão suficientemente claros para a população. A operação Lava Jato é que domina o noticiário, mas os motivos para o impeachment são outros, o que se convencionou chamar de pedaladas fiscais – e as pessoas não sabem o que é isso. Se você falar em transgressão à lei de responsabilidade fiscal, sabem menos ainda.
Também o momento seja de desmobilização, de fim de ano. Não é um período de muita atenção para a questão política. Isso me leva a pensar que Cunha talvez tenha se precipitado no momento de acolher o pedido de impeachment, porque não seria agora o melhor momento para mobilizar contra o governo.
Mas ter menos gente na rua agora não significa uma maior adesão a Dilma. As pessoas podem se mobilizar mais à medida que quem defende o impeachment consiga esclarecer que isso é maior que o conflito entre ela e Cunha e por que se quer cassar o mandato de Dilma Rousseff.
O entendimento popular sobre o processo tende a ficar claro e podem surgir novos elementos na Lava Jato e na operação Zelotes, que quebrou o sigilo do filho do presidente Lula.
Ao mesmo tempo, as questões que atingem à presidente, como a economia, o desemprego, a diminuição de renda, tendem a ser mais sentidas pela população depois de dezembro. É possível imaginar que os próximos protestos tenham uma mobilização maior. Por isso, o governo tenta acelerar o impeachment e a oposição tenta atrasá-lo. Os dois lados estão corretos em agir assim.”
Renato Perissinotto, professor de Ciência Política da Universidade Federal do Paraná
“As manifestações foram menores, tiveram menos força, e isso parece ser algo que vem se repetindo desde o início do ano, quando ocorreram protestos gigantescos e os seguintes foram mais fracos. Agora, o número de pessoas foi ainda mais reduzido, e acho que isso pode ser explicado por alguns fatores.
Primeiro, existe um desgaste da atividade de ir para a rua. Ainda que haja um espaço entre as manifestações e seja um domingo, as pessoas vão se cansando um pouco desse tipo de engajamento quanto ele corre reiteradamente.
Também houve uma apropriação pelo Cunha da bandeira do impeachment, o que deixou muita gente desconfortável, até aqueles que são claramente favoráveis a ele. Os problemas do Cunha estão em evidência, e as acusações em relação à presidente são discutíveis, não têm um argumento jurídico inequívoco.
Já contra quem abriu o processo, o Cunha, há informações mais comprometedoras, o que cria uma situação estranha para quem se manifesta a favor do impeachment.
E, como existe um debate em torno do embasamento jurídico do pedido, fica a sensação de que há um grupo de pessoas transformando o impeachment em uma estratégia eleitoral.
Por fim, em manifestações anteriores, houve uma defesa de uma intervenção militar e, mesmo sendo contra Dilma e favorável ao impeachment, muitas pessoas ficaram incomodadas.
Assim, esse acúmulo de fatos e informações que tornam a questão do impeachment mais incerta contribui para enfraquecer as manifestações.
As mobilizações futuras dependerão de como o processo do impeachment for encaminhado. Se começar a se consolidar como uma ameaça real à presidente, isso conferirá força aos movimentos populares. Se houver um retrocesso no processo e manifestações institucionais contra ele, a mobilização tende a recuar.
No fim das contas, é uma via de mão dupla. Se os movimentos forem fortes para colocar milhões nas ruas, isso pode afetar o processo, e a dinâmica do impeachment também afeta o ânimo das pessoas para protestar.”
Rafael Cortez, cientista político da consultoria Tendências
“Este domingo não foi um fato político importante. Os protestos não trouxeram nenhum fato novo, não foram capazes de abalar a atual correlação de forças entre apoiadores e opositores do impeachment no Congresso. Mas houve uma diminuição importante do número de manifestantes nas ruas.
Acho que foi realizado em um momento foi ruim. Estamos às vésperas do Natal. Isso dificulta a mobilização. Também houve uma relativa surpresa em relação ao acolhimento do pedido pelo Eduardo Cunha, porque sinais anteriores apontavam para uma certa acomodação por parte dele.
Também há uma dificuldade natural em mobilizar sem ter uma agenda positiva para os protestos. Tem um cansaço, não só pela dificuldade de manter gente na rua, mas por esta agenda negativa como um tudo, que ainda perpassa por toda a classe política, já que há gente da oposição envolvida na Lava Jato.
A divisão entre Cunha e Dilma ainda dificulta a construção da narrativa do impeachment, porque um dos principais opositores é Cunha, que está envolvido em escândalos da Lava Jato.
Desse modo, o destino final desta agenda vai depender das decisões estratégicas do governo no Congresso e da interpretação do Supremo Tribunal Federal sobre o rito do processo.
Se o governo não conseguir resolver esta agenda de forma mais rápida, as futuras manifestações podem voltar a crescer, porque haverá mais tempo para organizá-las e fazer uma pressão mais forte sobre os parlamentares.
Se o impeachment continuar caminhando na Câmara, isso pode incentivar os opositores e a presidente Dilma a se mobilizarem. Acho que agora o estágio do processo definirá o nível de mobilização popular em vez desta mobilização pautar o comportamento dos parlamentares.”
por Luis Nassif Online no Jornal GGN