05/04/2016 18:15
O possível impeachment de Michel Temer vai ganhando peso. O advogado Mariel Marra diz que vice-presidente é tão responsável, quanto Dilma, por pedaladas.
Nos últimos dias, a crise política ganhou um novo personagem: o advogado criminalista mineiro Mariel Marley Marra. Nesta semana, o ministro Marco Aurélio de Mello, do STF (Supremo Tribunal Federal), acatou um recurso de Marra e determinou que o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, desengavete um pedido de impeachment de Michel Temer e instale uma comissão especial para apreciá-lo. O pedido foi protocolado por Marra, na Câmara, no fim do ano e rejeitado por Cunha em janeiro.
Para o advogado, Temer é tão responsável pelos decretos que geraram as pedaladas fiscais, quanto a presidente Dilma Rousseff, que já enfrenta seu próprio processo de impedimento por este e outros motivos. “A gente não pode ter uma indignação seletiva”, afirmou Marra em entrevista. “Por uma questão de justiça, pau que bate em Chico bate em Francisco”, acrescentou, com a típica calma mineira.
Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista:
Por que o senhor decidiu apresentar um pedido de impeachment do vice-presidente Michel Temer?
Mariel Marley Marra: Quando foi apresentada a denúncia contra Dilma, em 2 de dezembro, eu observei que, dentre os crimes apontados, havia a questão dos decretos abrindo crédito suplementar. No momento em que Dilma assinou esses decretos, o governo estava em desacordo com a Lei Orçamentária. No caso, é crime de responsabilidade e é por isso que ela está sendo processada. Observei também que Michel Temer havia realizado a mesma conduta. Até estranhei não ver ninguém, na época, propor seu impeachment. Até mesmo por um senso de justiça, à parte qualquer questão partidária, acredito que “pau que bate em Chico tem que bater em Francisco”. A gente não pode ter uma indignação seletiva. Foi por isso que, em 21 de dezembro, protocolei esse pedido na Câmara. Em 5 de janeiro, mesmo com o Congresso em recesso, Cunha deixou de receber a denúncia. Desde então, aguardei o melhor momento para recorrer da decisão. Foi o que fiz agora, em 29 de março, quando impetrei o mandado de segurança contra o ato administrativo de Cunha. Como argumentei no mandato, o ato está eivado de vícios. Foi praticado com vício de motivo e vício de competência. Cunha apresentou um motivo inexistente para arquivar a denúncia: que ela não preenchia alguns requisitos formais. O termo técnico é que a denúncia era inepta. Mas a denúncia é apta, preenchendo todos os requisitos do artigo 41 do Código Penal, que se aplica de forma subsidiária ao pedido de impeachment. Ainda não é uma decisão definitiva. O ministro Marco Aurélio acolheu meu pedido e determinou que seja instalada uma comissão especial, como já há uma para avaliar o impedimento de Dilma.
Do ponto de vista jurídico, constitucional, é possível pedir o impeachment apenas do vice-presidente?
Marra: Sim, é perfeitamente possível, porque o ato é da Presidência da República. A autoridade competente, que o assina, é responsável por ele. No caso, quando Temer estava no exercício da Presidência da República, e assinou atos em desacordo com a Lei Orçamentária, praticou uma conduta típica de crime de responsabilidade.
Como o senhor avalia um eventual recurso de Cunha ao plenário do STF, contra seu pedido de impeachment?
Marra: O recurso que cabe, agora, é o de agravo, que não tem efeito suspensivo. Então, a princípio, é um recurso que vai para a apreciação do plenário do STF, no qual espero que seja confirmada a decisão do ministro Marco Aurélio. Prevalece, por enquanto, a decisão liminar, o que não impede que ela seja cassada. Isso é totalmente possível, mas não acredito que isso vá acontecer. Até porque, não me gabando, a argumentação que apresentei no meu recurso é que se trata de uma questão processual: minha denúncia é apta, e não inepta, como Cunha afirmou. Não é questão de mérito; se você concorda ou não com o impeachment. É meramente processual.
O senhor afirmou que esperou o melhor momento para recorrer. Por que, então, decidiu fazer isso no fim de março?
Marra: Primeiramente, porque eu aguardava uma revisão da decisão pelo próprio Cunha. Esperava que os pedidos de impeachment de Dilma fossem analisados e aceitos. Este momento, então, é adequado, porque o processo de impedimento da presidente já está em curso. Conforme eu disse, não quero que haja dois processos em curso. Quero que juntem Dilma e Temer, uma vez que há uma conexão dos dois na matéria, e há um acervo probatório comum. É como qualquer outro crime. Quando você constata que há um autor e um coautor, nada justifica que sejam processados em separado, até mesmo por uma questão de celeridade e eficácia do processo. Do ponto de vista da economia e da situação social, e com a experiência de 1992, sabemos que processos de impeachment são muito custosos para o país. Submeteríamos o país a dois processos seguidos de impeachment, o que é muito ruim. A opção é que ambos sejam julgados pelo TSE e sejam cassados. Isso, a meu ver, é abreviar o sofrimento do país. É por isso que, no meu pedido de impeachment, proponho que ele seja anexado ao de Dilma.
Impeachment é um processo jurídico e político. Boa parte do mercado já conta com o governo Temer. Do ponto de vista político, é conveniente que tanto Dilma, quanto o vice-presidente, sejam cassados? Não seria mais turbulência para o país?
Marra: Até pensando no mercado, o que acho melhor para todos é que o caso seja decidido o mais rápido possível. O fato é que há uma pesquisa mostrando que a maioria dos brasileiros não quer Temer como presidente. Embora algumas pessoas já estejam contando com isso, eu particularmente aposto em nova eleições. Neste momento de turbulência, elas trariam a representatividade que falta às forças políticas. As pessoas vão às ruas, hoje, não conseguem mais ver alguém que as represente. Se houver uma nova eleição até o fim deste ano, para que seja uma eleição direta, vai ser muito positivo para o país. Vamos virar essa página e escolher alguém que realmente represente o país.
Para haver impeachment de Dilma, é necessário o apoio de uma fatia do PMDB. Na medida em que o processo se estenda também a Temer, o PMDB pode votar contra. O senhor não acha que isso enterraria o impeachment?
Marra: O PMDB é um partido rachado; sabemos disso. Não sabemos ao certo quem apoiaria o impeachment de Temer. Até porque, dentro do PMDB, temos figuras como Renan Calheiros [presidente do Senado], que demonstra muito interesse em garantir que o PMDB não desembarque do governo. O partido é uma incógnita, mas o fato é que, orbitando o PMDB, existem outros partidos que, em conjunto, têm mais peso para decidir a questão. Esses outros partidos têm interesse em novas eleições.
Por Márcio Juliboni em O Financista