24/04/2016 08:56
“Dilma não é a única responsável pela calamidade. Com um misto de corrupção e negligência toda classe política traiu a boa-fé dos brasileiros” (The Economist).
A decisão da Câmara dos Deputados, por maioria absoluta de votos, a rigor não decidiu. Ficou a meio-caminho, pois a instauração e o julgamento do processo pertencem ao Senado.
Não se estranhe a presença da presidente Dilma Roussef à frente do governo, no desempenho das atividades que lhe confere a Constituição. Até o afastamento poderá nomear e exonerar ministros, sancionar, promulgar e fazer publicar leis, baixar decretos, exercer o comando das Forças Armadas, representar o Brasil no exterior.
Resistir até o derradeiro instante, porém, não irá lhe melhorar a biografia. Renunciar, entretanto, seria interpretado como ato de coragem e desprendimento, destinado a evitar que a Nação sofra com o vazio de poder instalado desde a formulação do pedido de impeachment.
Enquanto o Senado não se decide, a presidente permanece no Planalto no exercício de funções cerimoniais. Cauteloso, o vice-presidente Michel Temer recebe visitas no Palácio do Jaburu, mas evita, segundo a imprensa, se julgar vitorioso. Sabe que os deuses da política são volúveis e caprichosos, e que no pequeno mundo que o cerca todos se encontram sujeitos a falsidades, covardias e traições. O colégio eleitoral é reduzido, a maioria, segundo as pesquisas, está consolidada. Ainda assim – deve pensar Michel Temer – é prematuro sentar-se na curul presidencial.
Dilma Roussef não pode ser tolhida no direito ao devido processo legal, ao contraditório, ao amplo direito de defesa. Além do mais a aguerrida militância petista estará ativa, apoiada pela CUT, CONTAG, MST, MAB, Movimento Campesino. Juntos lutarão pela sobrevivência com a faca nos dentes, fazendo uso de tudo o que houver à mão.
Para o povo a menor demora é insuportável. Milhares de empresários quebrados clamam por solução, sem pedidos, dinheiro para fornecedores, impostos, folha de pagamento e encargos. 11 milhões de desempregados, sem salários para a comida, para o aluguel, prestação da casa financiada, convênio médico, remédios, mensalidades escolares, transporte, produtos de limpeza, aguardam que a economia se recupere e lhes ofereça chance real de voltar ao trabalho. A Nação deseja conhecer os compromissos de Michel Temer, já no discurso de posse. Se não for convincente, a lua de mel será tumultuada e rápida, 60 dias, se tanto.
A massa, conhecida como “povão”, rejeita mais sacrifícios. Foi às ruas contra Dilma, Lula, o PT, a crise, o desemprego, a corrupção, mas repeliu a presença do PMDB e dos tucanos. Tentar convencê-la a suportar maior sofrimento será tempo perdido. Cobrará providências imediatas. Cansou-se de ser engambelada. Afinal, um dos fortes argumentos pelo impeachment consistiu na impossibilidade de se esperar por 2018.
Problemas de economia falida não se resolvem com a formulação de hipóteses. Se os economistas de plantão soubessem o que fazer, não estariam batendo cabeças à procura de solução. “O Brasil precisa de governo forte, que não seja autoritário”, li no editorial de determinado jornal. Forte estou certo de que não será, pois qualquer medida firme que tente, esbarrará na resistência do Legislativo, com recurso ao Judiciário.
Impeachment é remédio constitucional válido, mas amargo, de resultados incertos. Exige a caracterização do crime de responsabilidade. Não consigo ignorar que há menos de dois anos Dilma teve mais de 50 milhões de eleitores, derrotando Aécio Neves e Marina Silva.
O presidente Temer será o eleito, mas sem opositor, por reduzido clube de senadores presididos por Renan Calheiros, liderados por Romero Jucá. Isso, a meu ver, faz diferença.
Por Almir Pazzianotto Pinto é advogado. Foi ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST)