13/02/2017 11:06
Um dos termos do acordo firmado entre os grevistas e o governo do Espírito Santo prevê o envio pelo Executivo de projeto de lei à Assembleia Legislativa, no prazo de 90 dias
A greve aquartelada da Polícia Militar do Espírito Santo é um ensaio para a execução mais ousada de uma estratégia que vem sendo posta em prática a conta gotas, muitas vezes com o beneplácito do Ministério Público.
O Ministério Público foi acometido da mesma ilusão vivida pelos governadores brasileiros: a de poder contar com uma milícia para chamar de sua, o que não conseguem com as Polícias Civis e Federal, legal e culturalmente mais vinculadas ao Poder Judiciário.
Foi, então, posta em marcha a estratégia de enfraquecer e sucatear a Polícia Civil, garrotear a PF e fortalecer a Polícia Militar, robustecida com grandes efetivos (maior que as Forças Armadas), armas e viaturas.
Oficiais passaram a dominar o mercado de segurança privada – toda festa tem PM de folga trabalhando, muitas vezes ajudados pelos colegas de serviço, que ficam passando coma viatura em frente ao estabelecimento para qualquer eventualidade, contratados por empresas que têm seus superiores como sócios e parentes mais chegados como gerentes.
Como no campo de guerra, a PM passou a avançar no território do adversário, cumprindo mandado de busca e passando a lavrar Termo Circunstanciado. Além disso, deslocou uma quantidade enorme de policiais para o que chamam de serviço velado, que nada mais é do que investigação policial, com o agravante de que, no caso dos militares, ela se dá sem nenhum dos controles a que estão submetidos os policiais civis por meio do Inquérito Policial.
Todas as diligências realizadas pela Polícia Civil são inseridas no Inquérito Policial, que passa pelo controle do delegado, do promotor e do juiz, enquanto a investigação do serviço velado é feita no tempo e na hora que mais lhes aprouver, sem necessidade de relatar a ação para ninguém. Quem pode assegurar que eles estão investigando ou trabalhando em empresas de segurança privada?
Há notícias de que policiais do serviço velado têm ingressado em domicílios sem ordem judicial, ao arrepio da Constituição e das leis, e ainda deixam a mensagem de que são civis, para confundir as pessoas e queimar a instituição congênere.
Um dos termos do acordo firmado entre os grevistas e o governo do Espírito Santo prevê o envio pelo Executivo de projeto de lei à Assembleia Legislativa, no prazo de 90 dias, exigindo bacharelado em Direito para os oficiais da PM, para que façam as vezes de delegados.
Enquanto isso, as ruas vão ficando às moscas.
Miguel Lucena é jornalista e delegado da Polícia Civil do Distrito Federal.