19/06/2018 15:01
”Estamos, a exemplo, vendo e ouvindo sobre incêndios criminosos com a destruição de uma centena de veículos de transporte coletivo em vários estados”
A ampla divulgação de fatos criminosos chocantes é a mensagem que seus autores desejam, e sem despesa.
O Brasil vem acumulando há tempos um trágico e já irresgatável passivo de todo tipo de violência.
É uma das mazelas de que tem padecido a nação e seu povo, e que se transformou em preocupante temor, a cada dia crescente em nosso espírito. Este fenômeno está paralisando o país. O povo está se tornando amedrontado em sair às ruas, em dirigir-se ao trabalho e dele voltar, em entreter-se, até em cumprir deveres que o obriguem a transportar-se, ou mesmo caminhar.
Uma das iniciativas mais proveitosas para deter a violência na vida brasileira seria, sem dúvida, noticiar menos a violência, ou melhor, silenciar sobre ela. Mais recomendável seria, talvez, um manual de imprensa, ou uma reflexão (até mesmo um extenso pacto dos editorialistas nacionais) sobre a conveniência de não veicular a violência, seja de que tipo for, ou se editarem recomendações oficiais necessárias sobre a comunicação impressa, radiofônica e televisiva da violência, quando só aceitável fosse ela para prevenir o cidadão de algum perigo potencial e imediatamente evitável.
É inconcebível que os legisladores não se deram conta ainda da inoportunidade e da inconveniência do noticiário livre, por vezes sucessivo, de um mesmo padrão ou tipo de violência, quando o fato policial provém do desempregado, do faminto, do revoltado ou mesmo dos portadores de uma psicopatia responsável por encaminhar o agente ao crime. As mídias concorrem entre elas com o inesperado, a tragédia, a catástrofe, o infortúnio, o desastre; se comprazem profissionalmente quando o alarme se apossa do leitor, do ouvinte e do telespectador. É preciso que o governo melhor se detenha sobre esta questão, que provoca análise lindeira à segurança nacional. Se as recém nomeadas “fake news” já ganharam salvaguardas institucionais na esfera eleitoral, contando até com comité voltado a uma vigilância da regularidade do prélio, porque não se adotarem iguais providências para o noticiário policial alarmante, em ocasiões em que se preserva valor maior, a própria vida, ou mesmo o patrimônio ?
Dia importante para o país e seu povo será quando as entidades de comunicação de norte a sul conseguirem discernir o que é necessário publicar e o que é ato de lesa-pátria levar ao conhecimento de todos. Esta mídia ainda não percebeu que o que a bandidagem quer é exatamente o que ora se faz, isto é, a variada e contínua publicidade de seus destemperos criminosos, que mostram aos companheiros encarcerados de outros estados de que foram capazes de agir, que podem fazê-lo novamente e os concita a também assim fazê-lo. A imprensa está se servindo de porta-voz do crime. O que importa para a democracia ou para a liberdade de imprensa (Oh! Liberdade, quantos crimes se cometem em seu nome ?), ou mesmo para nosso conforto nos ocultar os atos de vandalismo ? O que nos acresce ou alenta saber de demais ações ignóbeis cometidas pelos que sempre estão à margem da lei se estamos certos de que os órgãos de repressão estão atuando em nome da sociedade ? Que proveito pode-se retirar deste noticiário angustiante ? É certo que alguns pasquins, que vivem exclusivamente da imprensa sensacionalista, irão perder. Não faz mal. Reorientem seus leitores a apreciar uma melhor leitura, que efetivamente os acrescentem de informação ou conhecimentos úteis. Há, pois, sobradas razões a clamar por um noticiário saudável.
Estamos, a exemplo, vendo e ouvindo sobre incêndios criminosos com a destruição de uma centena de veículos de transporte coletivo em vários estados. O vasto e deprimente noticiário a respeito só fortalece as facções que as inauguraram. E as reportagens estimulam outras gangues a imitá-las. A boa escolha entre omitir e divulgar, é omitir.
Por José Maria Couto Moreira é advogado