24/08/2018 11:20
Por: IGUEL GUSTAVO DE PAIVA TORRES
“O Itamaraty está apto para contribuir com nova industrialização atualizada do país promovendo cooperação científica e tecnológica , com viés de longo prazo.”
Os programas de governo dos candidatos à presidência da República são genéricos e repetitivos no quesito da nossa falida política externa. Os candidatos à esquerda repetem o mantra da cooperação sul-sul e da prioridade da América do Sul, África e Ásia, sempre pelo plano político declaratório e, preferencialmente, em laços ideológicos. Os candidatos à direita-porque centro não existe no espectro supostamente partidário do Brasil- olham para Estados Unidos ,Europa e a Ásia rica como se fossem macacos avistando bananeiras em flor, e só falam em aumento de comércio exterior e abertura para investimentos via privatizações. Querem dinheiro em caixa para pagar juros capitalizados e dívida pública.
Ora, a solução preconizada de cooperação e de alianças sul-sul com foco em África, América Latina, Caribe e Ásia, do ponto de vista da realidade e dos interesses do Brasil, só funcionou temporariamente nas articulações multilaterais no âmbito do G-20, mas desaguaram em fracasso quando tiveram de confrontar a realidade do poder do comércio mundial nas negociações da rodada Doha, que pretendia flexibilizar e aumentar o acessos dos países em desenvolvimento aos grandes mercados mundiais. Em recente entrevista ao jornal Valor Econômico, o Embaixador José Alfredo Graça Lima, referência internacional nos temas de comércio exterior e nosso principal negociador na OMC ,em época recente, demonstra com clareza o primado de uma política interna anacrônica que pretende abertura comercial mas não abre mão do protecionismo que encobre a falta de produtividade e de competitividade do país para integrar as cadeias globais de produção que se formaram no século XXI.
O Brasil sempre deu um passo para a frente e dois para trás. Nos anos 90 deu-se inicio, no Governo Collor, a uma abertura para promoção da produtividade e da competitividade da indústria cartorial brasileira, prosseguida depois pelo Governo de FHC, sempre com base no pacotão, implementado parcialmente pela lei Kandir, ministro de Collor e posteriormente parlamentar.. No século XXI entrou em cena novo cenário protecionista com aplicação de tarifas de até trinta e cinco por cento em determinados setores, sempre a serviço da indústria automotiva e de outros setores atrasados da indústria ,acostumados ao aleitamento dos subsídios maternais dos governos eleitos com verbas empresariais.
O discurso da cooperação e da diversificação comercial com África , América Latina e Caribe nada mais foi do que um bonito pretexto para a venda bilionária de serviços, a países pobres e insolventes, por um selecionado cartel de empreiteiras, os “campeões nacionais”, financiados pelo dinheiro do contribuinte brasileiro, do cortador de cana aos professor es , que continuaram , em sua maioria, sem esgotamento sanitário, saúde e educação, abandonados à pobreza e à bolsa família. Enfim, uma fraude que nos levou a um tremendo desgaste diplomático junto às sociedades africanas, latino-americana e caribenha, que, um dia acreditaram na seriedade da velha proposta de liderança brasileira não hegemônica para uma efetiva cooperação sul-sul, de igual para igual em todos os domínios: do alargamento comercial à cooperação econômica, social e cultural.
Implantaram embaixadas em todos os rincões perdidos do terceiro mundo apenas para hastear a bandeira nacional e constranger os representantes do Brasil por não poderem atender e nem mesmo responder às demandas que nós mesmos criamos, a partir de Brasília. O foco do Itamaraty continuou sendo a doce vida europeia, porquanto nesses países periféricos a diplomacia real já estava sendo feita pela Odebrecht, Andrade Gutierrez, OAS, e demais membro do cartel, no mais alto nível possível, de presidente para presidentes. Agora, em seus programas de governo, já revelada a fraude, repetem o mesmo discurso vazio da cooperação sul-sul. São duros na queda.
À direita, anunciam uma associação do Brasil ou do Mercosul à Aliança do Pacífico, retórica que invoca a velha tentativa da associação Mercosul-Pacto Andino do Governo FHC, e que nunca chegou a escalar a Cordilheira dos Andes. Como diz José Alfredo Graça Lima, esses acordos comerciais amplos levam anos, às vezes década, para serem negociados. Os acordos comerciais na situação de penúria nacional em que nos encontramos devem ser bilaterais, com foco setorial e preferencial, e também não apenas restrito ao agronegócio, aço, auto peças e automóveis defasados tecnologicamente . A política externa brasileira precisa ser reavaliada de ponta a ponta , em todas as áreas de atuação externa do Brasil, inclusive comercial.
Mas, para isso, faz-se necessária a mudança de mentalidade no comando do Itamaraty e da Presidência da República, com a aplicação real da meritocracia no serviço público e do planejamento político-administrativo dos nossos postos no Brasil e no exterior. Quatro embaixadores em Paris, mais quatro em Roma, e mais de uma centena de diplomatas carimbando papéis na Europa e América do Norte. A residência do Brasil em Argel é um palacete mas a Embaixada não recebe pessoal suficiente do serviço exterior.
Um posto estratégico e importantíssimo para o Brasil, como Mumbai, a antiga cidade de Bombaim, sede do poder industrial da Índia, da defesa, do programa espacial, da tecnologia nuclear e da informática, fica limitado à área consular e com quase nenhum funcionário do quadro do Itamaraty qualificado para complementar o trabalho da Missão em Nova Deli na ativação de uma parceria de futuro entre Índia e Brasil.
As parcerias estratégicas para a defesa nacional passaram, nos governos recentes, a serem tocadas pela indústria privada, leia-se Odebrecht em primeiro lugar, que participa do desenvolvimento de um submarino nuclear na França, que não sai do lugar e ninguém sabe em que pé está.
O Itamaraty está apto para contribuir com nova industrialização atualizada do país promovendo cooperação científica e tecnológica , com viés de longo prazo. O Brasil está passando por uma rápida dissolução material e moral- uma candidata à presidente chegou a ser acusada de falta de malignidade- e não podemos deixar que candidatos de pantomina sejam utilizados por forças econômicas e políticas, como sempre ocultas ou disfarçadas , decididas a nos jogar no lixo do passado de indigência e dependência em que fomos cevados , todos nós, a maioria.