02/05/2019 13:20
”Talvez uma das mais chocantes conclusões é que apenas 4% dos brasileiros confiam uns nos outros (…) efeito colateral da erosão gerada pela corrupção nos pilares democráticos”
O ano de 2018 vai caminhando para o final, marcado por avanços e recuos no embate contra a corrupção, que parece uma corrida de obstáculos, que vão sendo superados, mas se reproduzem, parecendo ser infinitos, um desafio permanente e complexo à nossa perseverança e resiliência.
Logo no começo do ano, tomamos conhecimento que o Brasil havia caído 17 posições no Índice de Percepção da Corrupção da Transparência Internacional, indo para a posição 96, a pior de todas desde o início das pesquisas nos anos 90, só sendo nosso país salvo de ser o último colocado pelas quedas maiores de Libéria e Bahrein.
Mas o mundo tem observado e concluído que estamos saindo do patamar de exportador da corrupção para nação que luta e enfrenta o problema de frente, como o questionamento à escolha de uma violadora das leis do trabalho, condenada pela justiça, indicada pelo Partido Trabalhista Brasileiro para ser ministra do Trabalho.
A liminar do STF que impediu a posse de Cristiane Brasil foi fundada no princípio da moralidade, que muitos nem lembram existir, mas que figura na Constituição Federal, que chegou aos trinta anos de vida, vinte e seis a mais que a Lava Jato, que se consolida como um novo modelo de combate à corrupção, com patamar inédito de recuperação de 1/3 dos montantes desviados.
No segundo semestre, a abertura das contas dos partidos políticos pelo TSE, diante da pressão de organismos da sociedade civil, com protagonismo do Movimento Transparência Partidária, representou um marco na luta pela transparência e accountability por parte dos partidos, que insistem em não se submeter ao império da lei.
Era claro como a luz solar que Lula não figuraria na cédula eleitoral em 7 de outubro, mas seu partido quis surfar em sua popularidade e, contra a lei da ficha limpa (objeto de PL de um Senador ficha suja catarinense que propôs seu enfraquecimento, o qual foi felizmente arquivado), registrou seu nome como candidato, que, ao final não foi admitido, mas, graças à manobra, o partido conseguiu inflar a votação do substituto de Lula, que foi derrotado nas urnas, em eleições com expressivo índice de renovação.
No Senado, por exemplo, a circunstância de ser investigado pela Lava Jato pesou e figuras graúdas da política nacional foram barradas nas urnas, como Romero Jucá, Edison Lobão, o Presidente do Senado Eunício Oliveira, Lindbergh Farias e Dilma Rousseff.
Aécio Neves e Gleisi Hoffman, para manterem mandato tiveram que descer degrau e conseguiram vaga como deputados federais, pois com certeza sabiam que seriam barrados se se candidatassem ao Senado.
Dos 33 candidatos à reeleição, apenas 8 tiveram sucesso, mesmo com os partidos entregando aos postulantes à reeleição dez vezes mais que aos novatos, contexto em que foram recebidas com entusiasmo as Novas Medidas Contra a Corrupção –o maior pacote anticorrupção já feito no mundo–, 70 medidas organizadas em 12 eixos temáticos, em relação às quais 34 deputados federais e 11 senadores eleitos em 7/10 se comprometeram.
As novas medidas são analisadas pelo futuro Ministro da Justiça, o ex-juiz Sérgio Moro, que acumulará a pasta da Segurança Pública, e projeta o tema anticorrupção como fulcral no governo Bolsonaro, que terá nas mãos a sanção da PEC 333/17 (que elimina o foro privilegiado), caso o plenário da Câmara o aprove, já que o Senado já chancelou assim como a Comissão especial da Câmara por unanimidade.
A Comissão de Desenvolvimento Econômico aprovou o PL 10044/18, que moderniza a sistemática jurídica de criação e extinção de empresas, coibindo fraudes, corrupção e lavagem de dinheiro, mas a mesma Câmara aprovou PL que desmonta a Lei das Estatais (13303/16), permitindo a nomeação de cupinchas dos coronéis dos partidos para cargos técnicos de direção.
Infelizmente, a maioria do STF (julgamento ainda não acabado) tende a manter a validade de indulto Black Friday de Temer, que em 2017 quis livrar 80% das penas de corruptos, algo inédito, que com certeza influenciou nos resultados da Latinobarómetro 2018, que aponta que no Brasil apenas 7% dos políticos exercem o poder no Brasil para o bem comum e apenas 9% dos brasileiros estão satisfeitos com a democracia.
Talvez uma das mais chocantes conclusões é que apenas 4% dos brasileiros confiam uns nos outros –pior índice dos 18 países examinados, efeito colateral da erosão gerada pela corrupção nos pilares democráticos.
Mas, apesar de tudo, somos otimistas e acreditamos que em 2019 os cães corruptos ladrarão, mas nossa caravana passará e as coisas vão melhorar. Quem viver, verá.
O colunista entra em férias e retornará a suas atividades em 14 de janeiro de 2019. Ótimas festas a todas e todos.
Por Roberto Livianu, 50, é promotor de Justiça em São Paulo e doutor em direito pela USP. Atua na Procuradoria de Justiça de Direitos Difusos e Coletivos. Idealizou e preside o Instituto Não Aceito Corrupção. É comentarista da bancada do Jornal da Cultura, articulista da Folha de S. Paulo e do Estado de S.Paulo, e colunista da Rádio Justiça, do STF.