12/05/2020 00:48
”Agência do Banco do Brasil: a instituição é uma das que negociará dívidas; inadimplência se mantém estável; baixa inflação ajuda o consumidor”
Os dados mais recentes sobre o crédito divulgados pelo Banco Central mostraram que o endividamento está aumentando no país, mesmo no contexto da pandemia, como também tem evidenciado a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência dos Consumidores (PEIC), da CNC. O total de empréstimos e financiamentos alcançou R$ 3,6 trilhões em março, representando 48,9% do PIB (Produto Interno Bruto). Na tentativa de mitigar os efeitos da crise do covid-19 na demanda e manter algum poder de compra dos consumidores, o governo adotou medidas de injeção de liquidez e ainda mais estímulos ao crédito na ponta, com transferências diretas de recursos a milhões de pessoas.
O saldo das operações de crédito do sistema financeiro aumentou 2,9% em março de 2020 em relação a abril, após crescimento de 0,5% em fevereiro. Acumulado em 12 meses encerrados em março a variação foi de 9,6%, 2,9 pontos percentuais acima da taxa de variação observada no mesmo período em 2019. De janeiro a março deste ano, o avanço no crédito foi de 3,1%, comparativamente ao primeiro trimestre de 2019.
No que diz respeito aos juros do crédito com recursos livres para pessoa física, a taxa média alcançou 46,1% em março, recuou de 0,6 pontos percentuais contra abril, e de 6,3% em relação a março de 2019. Juros mais baixos representam menores custos para o crédito, o que ajuda a explicar o crescimento do volume de dívidas, empréstimos e financiamentos.
As famílias estão mais endividadas, mas ainda pagando suas contas e dívidas em dia. De acordo com o Banco Central, a inadimplência no crédito à pessoa física com recursos livres foi de 5,2% em março, ligeiro aumento de 0,1 p.p em relação a fevereiro de 2020, e de 0,4 p.p na comparação com março de 2019. Os dados da PEIC mostram estabilidade na proporção de famílias com dívidas e contas em atraso, e ainda das que afirmam que não terão condições de quitas suas dividas.
Algumas ações foram implementadas pelo governo para injetar recursos diretamente aos consumidores. O “corona voucher”, por exemplo, está ajudando as famílias dos informais a manterem algum nível de consumo e ainda quitarem seus compromissos financeiros.
No último dia 30 de abril, um relatório divulgado pela Caixa Econômica Federal informou que foram liberados R$ 35,5 bilhões para 50 milhões de brasileiros, dentre trabalhadores informais, microempreendedores, autônomos e desempregados, durante a pandemia.
De acordo com o Ministério da Economia, a despesa no Orçamento apenas para o beneficio emergencial é de R$ 98 bilhões em três meses, cerca de 1,3% do PIB.Trata-se do maior volume de recursos para o orçamento deste ano nas despesas discricionárias do governo federal, que antes da crise de saúde eram R$ 95 bilhões. Assim, o coronavoucher é a medida de maior impacto fiscal anunciada ate o momento, e o governo considera que os gastos com as transferências poderão aumentar, caso os efeitos da pandemia sejam mais duradouros do que o esperado.
Além disso, foram também anunciadas liberação de novos saques das contas do FGTS e antecipação do 13o salário de beneficiários do INSS, o que deverá injetar quase R$ 148 bilhões na economia.
O governo adotou ainda um pacote de ações voltadas à manutenção dos empregos formais, que garantem estabilidade provisória enquanto durar a pandemia, em que se espera que cerca de 24 milhões de postos de trabalho não sejam fechados no país. Até 5 de maio, 5,5 milhões de contratos de trabalho foram suspensos ou a jornada foi reduzida, preservando esses postos no emprego formal e alguma renda a esses trabalhadores. Sem a possibilidade garantida pela MP 936, esses cidadãos somar-se-iam aos quase 13 milhões de desempregados no país, segundo os dados da Pesquisa Nacional de Amostras por Domicilio de março, divulgada no último dia 30 de abril.
Por fim, um fator que adicionalmente tem beneficiado os consumidores é a inflação baixa. Com componentes dos índices de preços apresentado variações negativas, a renda das famílias é menos pressionada, com maior “espaço” ou disponibilidade na parcela média dedicada ao pagamento de contas e dividas.
Com isso, apesar da crise de saúde afetar os condicionantes do consumo e o desempenho da economia real, as medidas adotadas pelo governo, com a grande injeção de liquidez, aparentemente têm alcançado os consumidores. Mesmo com as incertezas e o endividamento elevado, a inadimplência não mostra trajetória explosiva, pelo menos não ainda.
Por Carlos Thadeu de Freitas Gomes é economista-chefe da CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo). Foi presidente do Conselho de Administração do BNDES e diretor do BNDES de 2017 a 2019, diretor do Banco Central (1986-1988) e da Petrobras (1990-1992)