Opinião – nenhum brasileiro está para trás na pandemia

08/12/2020 14:40

Governo acerta no auxílio emergencial
Consegue garantir ajuda a população
Não compromete equilíbrio fiscal

O benefício foi criado em abril pelo governo federal, com valor de R$ 600, e estendido até 31 de dezembro por meio de medida provisória, com parcelas de R$ 300

Um arsenal de medidas foi direcionado pelo governo para combater os efeitos da crise sanitária na economia, com grande destaque ao Auxílio Emergencial (AE) ou coronavoucher, que ajudou os mais vulneráveis no pagamento de despesas e manutenção do consumo de produtos essenciais. A transferência emergencial evitou um tombo maior da demanda doméstica, variável que nos últimos anos teve desempenho importante no PIB. Com a medida, o governo mostrou capacidade ágil de reação à crise, sem adoção de programas associados a obras públicas. A promessa de que nenhum brasileiro ficaria para trás vem sendo cumprida desde então. Agora compete ao Congresso dar sequência à promessa, votando a PEC emergencial.

O governo não se omitiu de suas responsabilidades sociais, mas não abandonou sua obrigação com a responsabilidade fiscal. O bom desempenho da economia em 2019 garantiu a credibilidade necessária para que, hoje, a sociedade desfrute dos benefícios de menores taxas de inflação e de juros do que tivemos em um passado recente.

O AE foi, sem dúvidas, a principal e mais rápida ação para garantir renda às famílias. A manutenção dos empregos formais pela possibilidade de suspensão do contrato de trabalho ou redução da jornada também foi importante, pois a principal fonte de renda das pessoas é proveniente do trabalho. No entanto, em função do incremento da informalidade nos últimos anos, era fundamental socorrer as pessoas que de uma hora para outra ficaram sem qualquer fonte de recursos.

De acordo com os dados do Caged de outubro, o país teve geração liquida de 394.989 postos de trabalho formais, no quarto mês de saldo positivo e crescente. As perdas de vagas acumuladas entre fevereiro e abril foram assombrosas, porém a recuperação gradual principalmente do setor terciário tem motivado novas contratações, o que fez o resultado acumulado no ano até outubro ser menos negativo do que se esperava.

A média mensal de 12 meses dos desligamentos está em queda, embora as estatísticas de desembolso de seguro-desemprego tenham crescido nos últimos meses. Estes dados refletem o inevitável fechamento de empresas durante a pandemia.

O comércio e os serviços têm ampliado as contratações desde julho e agosto, respectivamente, apoiando a evolução positiva dos dados do Caged. As famílias de maior renda estão aos poucos retomando o consumo de serviços, o que tem reduzido as perdas na atividade do setor e motivado novas contratações. No caso do comércio, as festas de fim de ano fazem do último trimestre o mais importante no calendário do setor, em termos de incremento do faturamento, o que naturalmente motiva o aumento sazonal das contratações.

A retomada do apetite para contratação de funcionários no comércio foi rápida: aumentou pela quarta vez em novembro a proporção de comerciantes dispostos a ampliar o quadro de funcionário, chegando a 75% deles. Em julho, cerca de 75% dos empresários do comércio afirmavam que reduziriam a quantidade de funcionários, quadro que se reverteu rapidamente em três meses.

O dado faz parte do Índice de Confiança do Empresário do Comércio (Icec), apurado todos os meses pela CNC desde março de 2011. O índice de intenção de contratação de funcionários retornou nesse mês ao nível pré-pandemia, com mais de 125 pontos.

Diante da crise sem precedentes, o estado não poderia se furtar de intervir ampliando os gastos sociais. No início da crise, céticos desconfiaram da adoção de iniciativas mais abrangentes para garantir o sustento e o consumo. O Ministério da Economia provou, entretanto, que é possível conciliar uma face liberal com políticas econômicas intervencionistas quando necessário, com monitoramento dos gastos do endividamento público.

De acordo com dados da Secretaria do Tesouro, R$ 575 bilhões, ou 8,2% do PIB, é o total de gastos estimados em novembro com a crise da Covid-19, em que cerca de 85% ou R$ 488 bilhões foram pagos até o momento. Desse total pago no orçamento, 56% foram destinados às famílias nos benefícios emergenciais ou cerca de R$ 276 bilhões.

Com os gastos decorrentes dos efeitos da pandemia, o endividamento público alcançou um novo patamar, acelerou o déficit primário e o acirramento da dívida bruta em relação ao PIB. As projeções do Tesouro apontam que a dívida bruta e a dívida líquida encerrarão 2020 em 96% e 68,2% do PIB, respectivamente, aumentos de 20 e 13 pontos percentuais em relação ao observado em 2019 para ambos os indicadores.

O quadro exige um esforço fiscal no médio prazo ainda maior do que se buscava antes da crise, e o Congresso precisa fazer sua parte para ajudar a economia nesse momento de retomada, acelerando a análise das propostas que fornecem alternativas às distorções tributárias brasileiras, como a PEC 45.

Já estamos em rota de racionalização das despesas públicas, com a coragem que se teve para uma reforma administrativa que, dentre outras iniciativas, congelou salários dos servidores. A reforma da previdência começou a calçar esse caminho fiscal mais virtuoso ainda em 2017. O momento atual requer que sejam potencializados os canais de ampliação da atividade econômica e de geração de receitas.

Os juros ainda em patamar baixo contribuem para um menor custo da dívida, e mesmo com as pressões inflacionarias correntes mais disseminadas, os cenários perspectivos indicam que a inflação retrocede no curto e médio prazos, e o Copom (Comitê de Política Monetária) não terá necessidade de subir a Selic tão rápido.

Sustentar a recuperação da atividade no médio prazo de fato depende da percepção dos agentes quanto à capacidade de equilíbrio fiscal. Porém não é menos importante agir de acordo com a conjuntura. Simonsen nunca acreditou em planejamento, pois segundo ele, é impossível planejar no longo prazo em uma conjuntura de equilíbrio dinâmico instável.

Em que pese o enorme desafio de seguir auxiliando famílias e empresas e manter a credibilidade nas metas fiscais, a equipe econômica tem sido exitosa. O Congresso precisa dar andamento às discussões sobre as propostas para reforma tributária, para ancorar as expectativas, garantir as conquistas até aqui, e acelerar a recuperação econômica deste ciclo com algum nível de investimento.

 

 

 

 

Por Carlos Thadeu de Freitas Gomes, 72 anos, é economista-chefe da CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo). Foi presidente do Conselho de Administração do BNDES e diretor do BNDES de 2017 a 2019, diretor do Banco Central (1986-1988) e da Petrobras (1990-1992).

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