19/10/2021 12:28
Com a evolução da taxa cambial e a retomada do consumo global, os preços das commodities no Brasil estão com valores elevadíssimos. Assim, vemos reclamações sobre os preços do açúcar, da carne, do óleo de soja e de outros produtos que fazem parte da cesta básica da população. Com os combustíveis, que também são commodities, a situação não deveria ser diferente.
O argumento de que o Brasil, por ser autossuficiente na produção de petróleo, deveria ajustar o preço dos derivados levando em consideração os custos e não a paridade internacional estão totalmente equivocados. O Brasil tem, sim, uma produção de petróleo superior à necessária para suprir o mercado nacional. No entanto, o petróleo é uma commodity, e commodities tem seus preços determinados pelo mercado internacional. Países que não seguem essa regra acabam por serem vítimas da chamada maldição dos recursos naturais. Um exemplo é a Venezuela, que destruiu sua indústria de petróleo, bem como a a sua empresa PDVZA.
Por outro lado, há alguns anos o Brasil depende da importação dos principais produtos para atender as demandas do mercado. Assim é com o óleo diesel –atualmente precisamos importar em torno de 25% do volume consumido– e com a gasolina –que, para atender a demanda, faz-se necessária a importação da ordem de 10% a 15%, dependendo da competitividade do produto substituto para os motores do ciclo Otto, que é o etanol hidratado.
Por este motivo é que, em entrevista publicada na imprensa recentemente, o presidente da Petrobras, general Silva e Luna, afirmou que “a companhia precisa praticar preços em linha com o mercado internacional para não haver risco de desabastecimento”. Ou seja, se as importações dos combustíveis não forem viabilizadas, haverá risco de desabastecimento, ou o acionista da Petrobras pagara a conta.
É bom lembrar que a Petrobras teve de pagar US$ 3 bilhões de multa dada pela Suprema Corte Americana por subsidiar a venda de combustíveis importados, lesando os seus acionistas privados e a União, o que inviabilizou o pagamento de dividendos por muito tempo. E é bom lembrar que todos os brasileiros são acionistas da Petrobras, representados pela União.
O fato é que, apesar da Petrobras perseguir nos últimos anos os preços praticados no mercado nacional, tanto os preços da gasolina quanto do óleo diesel estão consistentemente defasados dos preços do mercado internacional desde abril de 2021. O petróleo Brent, que é uma referência para precificação, era cotado em outubro de 2020 em US$ 40/barril e agora em outubro de 2021 superou US$ 80/barril. E a taxa cambial flutua em torno de R$ 5,40/US$. Com o inicio das campanhas eleitorais de 2022, vemos políticos querendo a volta da política da intervenção nos preços da refinaria. Isso representa o retorno das perdas para a Petrobras, desequilíbrio concorrencial, insegurança para realização de investimentos no setor e aumento da dificuldade para o avanço do importante programa de desinvestimento nas refinarias da Petrobras.
O governo ainda não conseguiu desenhar uma solução eficaz para resolver o problema da precificação dos combustíveis. Desde maio de 2018, quando houve a greve dos caminhoneiros, alternativas têm sido discutidas e uma delas, detalhada pelo CBIE, foi a criação de um Fundo de Estabilização de Preço, com o uso de parte da receita adicional dos royalties recebidos pelo governo, que são vinculados ao preço do petróleo no mercado internacional. Ou seja, se o preço do petróleo sobe, os preços dos combustíveis precisam subir, mas a receita do governo com os royalties também sobe na mesma proporção.
A outra solução seria a Cide. Não a mais recente, que foi distorcida no governo do PT, que tirou seu caráter regulatório –passou a ser arrecadatório, compartilhada com Estados e municípios. Por fim, até discutir a volta da conta petróleo, que trazia um subsidio explícito pela fixação de um preço do barril do petróleo, pode fazer sentido
O que não podemos é esconder subsídios intervindo nos preços da Petrobras na refinaria. Aqui estão exemplos de como garantir a estabilização dos preços dos combustíveis, sem intervenção e prejuízo para a Petrobras. No caso do botijão de gás, a solução é a criação de um cartão eletrônico especifico para a compra do botijão, Esse cartão seria carregado com um valor que permitisse que famílias inscritas no Bolsa Família pudessem adquirir o botijão a preços inferior ao vendido no mercado. Os recursos poderiam vir de inúmeras fontes desde os royalties ate parte do Fundo Social gerenciado pela PPSA.
A solução definitiva só virá com a privatização da Petrobras. Enquanto a empresa for de economia mista, tendo o Estado como controlador, os seus benefícios corporativos e as práticas monopolistas serão mantidos –a favor da corporação e, muitas das vezes, contra os interesses do Brasil.
Por Adriano Pires, 62 anos, é sócio-fundador e diretor do Centro Brasileiro de Infra Estrutura (CBIE). Doutor em Economia Industrial pela Universidade Paris XIII (1987), Mestre em Planejamento Energético pela COPPE/UFRJ (1983) e Economista formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1980). Atua há mais de 30 anos na área de energia.