Opinião – No Brasil, ladrão tem o ”direito de trabalhar”

Num país em que um condenado por corrupção e lavagem de dinheiro, em três instâncias e por nove juízes diferentes, é candidato à Presidência da República, é possível esperar tudo, escreve J. R. Guzzo

01/11/2022 06:37

”Um filho do ex-presidente foi assaltado há pouco no centro de São Paulo e, automaticamente, absolveu os bandidos”

Professor de Roraima quis fazer crer em sala de aula que um assaltante está exercendo o seu trabalho. Foto: Pixabay

A notícia saiu na Gazeta do Povo, e foi confirmada pelas autoridades competentes: um professor de escola secundária de Roraima afirmou, em plena sala de aula, que um assaltante tem o direito de roubar as pessoas porque está apenas “trabalhando”. Ele é um cidadão injustiçado e carente que, em seu entender, precisa ganhar a vida, etc, etc, etc; não há nada de errado, nem de anormal, em sair por aí metendo um revólver na cara dos outros para roubar o que precisa, etc, etc, etc.

Qual é o problema? Ele tem o direito de prover o seu sustento como todo mundo, não é mesmo? Um aluno perguntou se estaria certo ele trabalhar dez anos seguidos para comprar um carro, por exemplo, e ter de entregar o seu carro para o ladrão. Tudo o que o professor fez foi dizer que “ninguém” consegue comprar um carro no Brasil com dez anos de trabalho, diante de toda essa injustiça social que, segundo ele, está aí. Fora isso, deu uma bronca no aluno.

É possível fazer todo tipo de comentário diante de um despropósito desses, mas, com certeza, há um que estará errado: dizer que isso só acontece em Roraima ou em algum outro fim de mundo desse “brasilzão” atrasado. Falso. Pode acontecer em São Paulo, no Rio de Janeiro ou em Brasília, em qualquer escola e em qualquer dia do ano letivo.

Na verdade, o manifesto social do professor de Roraima é tão parecido com a posição semioficial da esquerda brasileira sobre crime e criminosos, mas tão parecido, que não dá para ver bem qual é a diferença. Afinal das contas, gente muitíssimo mais conhecida do que ele diz basicamente a mesma coisa – e é considerada a quinta essência do progressismo nacional. O professor está apenas repetindo o que ouve falarem nestas cumeeiras de sabedoria.

Como esperar outra coisa? Um dos peixes mais graúdos da advocacia criminal brasileira, devoto fervoroso da candidatura Lula à Presidência, não disse recentemente, na frente de todo mundo, que os crimes pelos quais a Justiça brasileira condenou o ex-presidente deveriam ser esquecidos? “Já aconteceu”, disse ele. “O que adianta punir?”

Ou seja: o sujeito mata a mãe, mas já que a mãe está morta mesmo, não adianta nada punir o filho, certo? O advogado em questão julgou oportuno, também, dar uma lição de ciência penal ao público. “Não se ache que a punição irá combater a corrupção”, afirmou. Na sua opinião, segundo se pode deduzir, o corrupto está apenas “trabalhando” para assegurar o próprio sustento – algo mais ou menos na mesma linha de raciocínio exibida pelo professor que defende os assaltantes. Qual é a grande diferença?

Num país em que um condenado por corrupção e lavagem de dinheiro, em três instâncias e por nove juízes diferentes, é candidato à Presidência da República, é possível esperar tudo – a começar pela defesa do crime nas salas de aula. Essa indulgência plenária para os delinquentes vale, até mesmo, quando as suas vítimas estão dentro dos círculos mais elevados da esquerda lulista.

Como se noticiou amplamente, um filho do ex-presidente foi assaltado há pouco no centro de São Paulo e, automaticamente, absolveu os bandidos. De quem é a culpa, então? Segundo o filho de Lula, o culpado é “o Bolsonaro” – ele “não adota políticas sociais” e, em consequência disso, os cidadãos saem por aí assaltando os outros. O professor de Roraima, como se vê, poderia ser um consultor valioso da campanha de Lula.

 

 

 

 

Por J.R.Guzzo é jornalista. Começou sua carreira como repórter em 1961, na Última Hora de São Paulo, passou cinco anos depois para o Jornal da Tarde e foi um dos integrantes da equipe fundadora da revista Veja, em 1968. Foi correspondente em Paris e Nova York, cobriu a guerra do Vietnã e esteve na visita pioneira do presidente Richard Nixon à China, em 1972. Foi diretor de redação de Veja durante quinze anos, a partir de 1976. Nos últimos anos trabalhou como colunista em Veja e Exame.