Há alguns conhecimentos, algumas dúvidas, algumas pesquisas e algumas teorias que não convém ao homem comum. Ao ser pequeno que nunca quero deixar de ser. Escreve Paulo Polzonoff Jr.
14/02/2023 07:44
“Sem esperar qualquer tipo de resposta, fico me perguntando que tipo de vazio na alma as pessoas estão tentando preencher agora”
OVNIs. Ou UFOs, como se dizia na minha época. Taí um assunto que eu julgava morto e enterrado desde que inventaram as câmeras digitais e principalmente depois da popularização dos editores de imagem. Mas não é que o tema voltou à moda no fim de semana? Depois do estranho balão chinês, objetos voadores não-identificados foram localizados e aparentemente abatidos nos Estados Unidos, Canadá, China e Uruguai.
Ninguém está entendendo nada e eu mentiria se dissesse que tenho informações privilegiadas ou uma capacidade extraterrestre (pun intended) de raciocínio para lhe dizer do que se trata essa confusão toda. Ou melhor, posso não saber do que se trata a confusão, mas sei que ela nasce justamente da ideia de que estamos cercados por pessoas donas de informações privilegiadíssimas e/ou dotadas de uma capacidade de raciocínio sobre-humana.
Mais do que a dúvida “carnaval é bom ou é ruim?”, sei que a pergunta “estamos sozinhos no Universo?” desperta reações apaixonadas. É assim desde H.G. Wells. Quem acredita em extraterrestres apela para a lógica matemática. É impossível que, em meio a tantas galáxias e estrelas e sistemas solares, a Terra seja o único planeta habitado – dizem. Uma vez cercados pela tecnologia e afogados no entendimento estatístico do mundo, realmente é difícil rebater o argumento, apesar de ele exalar um cheiro forte (e fétido) de cientificismo e enxofre.
Difícil, mas não impossível. Mas para isso é preciso apelar para a imaginação e a fé, dois elementos desvalorizados num mundo dominado pelo racionalismo. E, no mais, quem sou eu para tirar dos outros qualquer tipo de crença? Há quem acredite em marcianos, há quem acredite no comunismo, há quem acredite no apocalipse climático. Há até quem acredite no ideário do PT. Como já dizia alguém, acho que Chesterton, quem não acredita em Deus acredita em qualquer coisa. Qualquer coisa mesmo.
Contatos imediatos
Correndo o risco de parecer ainda mais reacionário do que sou, vou deixar registrado aqui que não acredito em alienígenas. Não só isso, mas o assunto todo me parece envolto numa névoa kitsch de existencialismo de massa. Para mim, estamos sozinhos no Universo. Somos especiais – por mais que, contraintuitivamente, seja necessária muita humildade para se (nos) reconhecer assim.
Mas, veja bem, só “milito” na causa antialienígena quando esse tipo de bobagem vem à tona para deixar todos em polvorosa. A verdade é que raramente penso no assunto. A não ser que seja para rir (com todo o respeito, claro) de quem acredita que as pirâmides do Egito foram construídas com o auxílio de guindastes aliens. Ou que a Civilização Inca era, na verdade, um resort para venusianos entediados.
“Ah, mas a lógica matemática…”, vai me dizer um chato insistente. Porque já reparou como são chatas as pessoas que estão sempre tentando convencer as outras de que as razão lhes pertence, toma aqui um pedacinho do meu superconhecimento, da minha iluminação, débito ou crédito? Dou de ombros, pensando cá co’s meus botões que meu contra-argumento mergulha desavergonhadamente o dedinho no lago cristalino do que vou chamar aqui de “ignorância esclarecida”. Quem diria, hein?
Há alguns conhecimentos, algumas dúvidas, algumas pesquisas e algumas teorias que não convém ao homem comum. Ao ser pequeno que nunca quero deixar de ser. Em outras palavras, me causa estranheza o fato de tanta gente ficar obcecada com a possibilidade de um dia estabelecermos o tal de contato imediato de terceiro grau. Sem esperar qualquer tipo de resposta, fico me perguntando que tipo de vazio na alma as pessoas estão tentando preencher agora, neste momento, em pleno 2023, com essa história recauchutadíssima de OVNIs.
Me parece, e essa é só uma especulação entre várias, que há nisso um desejo latente de provar a inexistência de Deus, a aleatoriedade de tudo e, finalmente, de provar que somos insignificantes perante o Universo e ao mesmo tempo relevantíssimos enquanto espécie. Nem tão no fundo assim, trata-se de mais uma tentativa de se esmagar o espírito humano criando uma sedutora armadilha para a qual se sentem atraídos aqueles que já abdicaram de suas alminhas. Já vi esse filme antes, com a Covid-19. E o final não foi nada feliz.
Por Paulo Polzonoff Jr. é jornalista, tradutor e escritor.