Em vez de prometer alívios fiscais superficiais durante campanhas eleitorais, o governo deve se comprometer com políticas sérias e sustentáveis para combater a defasagem do IRPF. Escreve Murillo Torelli
24/02/2023 10:29
“A questão da defasagem do IRPF é um reflexo da falta de planejamento e de gestão responsável da economia por parte do governo”
A defasagem do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) é um assunto que vem sendo debatido há alguns anos no país. De acordo com o Sindicato dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco), em 2023 houve uma defasagem recorde de 148% no cálculo deste imposto. A defasagem foi calculada considerando o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Se a correção total da tabela fosse feita, apenas pessoas que ganhassem mais que R$ 4.683,95 seriam obrigadas a pagar e declarar o IRPF. De acordo com o estudo do Sindifisco, a correção total acabaria retirando 13 milhões de contribuintes da obrigatoriedade de declarar o imposto.
No entanto, o governo tem se mostrado reticente em corrigir a tabela do IRPF, diante da renúncia fiscal de R$ 101,6 bilhões que isso significaria. Atualmente, pessoas que ganham mais que R$ 1.903,98 já são obrigadas a pagar o imposto. Isso significa que, mesmo pessoas que ganham apenas um pouco acima do salário-mínimo, já estão na lista de contribuintes do IRPF.
A situação fica ainda mais preocupante quando lembramos das promessas feitas durante as últimas eleições presidenciais. O atual presidente prometeu que aqueles que recebessem um salário de até R$ 5 mil por mês não pagariam imposto de renda. No entanto, essa promessa ainda não foi cumprida e a defasagem do IRPF continua sendo uma realidade para a maioria dos contribuintes. Aliás, a defasagem até aumentou, pois tivemos inflação que resultou em aumento do salário-mínimo sem correção da tabela.
É importante lembrar que, em uma sociedade justa, aqueles que ganham mais devem contribuir com mais imposto. No entanto, isso não significa que o governo não possa encontrar alternativas para equilibrar a queda na arrecadação do IRPF, com medidas progressivas, como a volta da taxação de lucros e dividendos. O que não pode acontecer é a criação de novos tributos sem a redução ou extinção dos antigos.
A defasagem do IRPF é um problema sério e precisa ser corrigido o mais breve possível. É fundamental que o governo cumpra suas promessas eleitorais e encontre alternativas para equilibrar a arrecadação de impostos, sem prejudicar a população de baixa renda.
Além disso, é preciso ressaltar a importância da redução dos gastos públicos como forma de equilibrar as contas do governo e evitar a necessidade de aumento de impostos. O governo deve fazer uma revisão rigorosa de seus gastos, eliminando despesas supérfluas e desnecessárias, e priorizando investimentos em saúde, educação e segurança, que são essenciais para o bem-estar da população.
A questão da defasagem do IRPF é um reflexo da falta de planejamento e de gestão responsável da economia por parte do governo. É inaceitável que em um país tão rico em recursos, milhões de pessoas estejam sendo obrigadas a pagar impostos excessivos e ineficientes, enquanto outras tantas sofrem com falta de serviços básicos.
Em vez de prometer alívios fiscais superficiais durante campanhas eleitorais, o governo deve se comprometer com políticas sérias e sustentáveis para combater a defasagem do IRPF e garantir a justiça fiscal. A correção da tabela do IRPF deve ser feita de forma equilibrada, sem prejudicar aqueles que já estão sobrecarregados com a carga tributária atual. O caminho é buscar soluções justas, que garantam a arrecadação necessária para o financiamento do Estado, sem prejudicar a economia e a vida das pessoas.
Por Murillo Torelli é professor de Contabilidade Financeira e Tributária no Centro de Ciências Sociais e Aplicadas (CCSA) da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM).