Opinião – As emendas parlamentares e o controle externo

Ainda que as emendas se revistem de elevada importância político-administrativa, tais gastos não se sobrepõe as regras dedireito público financeiro. Escreve Guilherme Antonio Maluf.

20/12/2023 05:22

“É um instrumento que Legislativo pode utilizar na fase de apreciação legislativa”

A emenda parlamentar é um instrumento que o Poder Legislativopode utilizar na fase de apreciação legislativa para influir no processo deelaboração do orçamento anual.

Tais emendas podem acrescentar, suprimir oumodificar determinados itens do projeto de lei orçamentária enviado peloExecutivo. Ou seja, por meio das emendas parlamentares os deputados esenadores podem opinar ou influir na alocação de recursos públicos em funçãode compromissos políticos que assumiram durante seu mandato, tanto junto aosestados e municípios quanto a instituições.

De acordo com a Constituição da República, as emendasindividuais ao projeto de lei orçamentária serão aprovadas no limite de 2% daReceita Corrente Líquida do exercício anterior ao do encaminhamento doprojeto, observado que a metade desse percentual será destinada a ações eserviços públicos de saúde.

As emendas são de execução orçamentária e financeira obrigatóriae, em respeito às regras de planejamento e responsabilidade fiscal, devem sercompatíveis com o Plano Plurianual e a Lei de Diretrizes Orçamentárias.

No caso das emendas destinadas as ações e serviços de saúde, oseu valor será computado para fins de cumprimento do percentual mínimoestabelecido constitucionalmente para essa área, sendo vedada a destinaçãopara pagamento de pessoal ou encargos sociais.

Alguns Estados, a exemplo de Rondônia e Roraima, tentaramreduzir esse percentual, porém o Supremo Tribunal Federal suspendeu aaplicação desses dispositivos por compreender que a norma local afrontou aConstituição Federal ao fixar limite em patamar diferente do estabelecido no art.166.

No caso de Mato Grosso, o Ministro Dias Toffoli deferiu liminar nosautos da Ação Direta de Inconstitucionalidade ADI 7493, na última sexta-feira(15/12), autorizando a Assembleia Legislativa a adequar o Projeto de Lei Orçamentária Anual de 2024 ao percentual de 2% estabelecido no §15 do art.164, conforme redação dada pela Emenda Constitucional 111/2023. A decisãoainda será objeto de apreciação Plenária, porém, vai ao encontro dajurisprudência que vem se consolidando naquela Corte.

Outro ponto que merece reflexão é a obrigatoriedade deobservância dessa norma pelo Legislativo Municipal, uma vez que o STF, aojulgar as ADIs, reconheceu que a matéria versa sobre normas gerais de direitofinanceiro, de competência exclusiva da União (art. 24, I, e §1º, da CF/88).

Nos últimos anos foi possível perceber um salto no montante derecursos dedicado as emendas parlamentares. Para 2024, a proposta de LeiOrçamentária Anual da União prevê quase 40 bilhões de reais destinados aindicação dos parlamentares federais, o que demonstra a importância políticoadministrativa de tais recursos.

Em Mato Grosso, a estimativa é que 700 milhões sejam reservadospara as emendas dos 24 deputados em 2024, representando 28 milhões pormembro do parlamento. Há uma tendência de crescimento das receitas matogrossenses e, por consequência, da RCL que impacta diretamente no montanteque será destinado as emendas e, em especial, as ações e serviços de saúde.

Nesse contexto, a fiscalização de tais recursos demonstra-se comoum desafio aos órgãos de controle. O Tribunal de Contas da União vemtrabalhando em uma instrução normativa com o fim de estabelecer osparâmetros para fiscalização das emendas no âmbito federal, porém, taliniciativa é ainda é tímida.

Em se tratando de transferências voluntárias de recursos, aaplicação de tais valores devem ser fiscalizada pelos órgãos locais. E, nesteponto, o papel do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso se mostraessencial, ele deve ir além da fiscalização contábil, financeira e avançar sobre aconcreta execução dessas ações.

Certamente os tribunais de contas locais terão de se adaptar,criando mecanismos e até mesmo forças-tarefa para averiguar a legalidade dosrecursos direcionados via emendas parlamentares.

Isso porque, ainda que as emendas se revistem de elevada importância político-administrativa, tais gastos não se sobrepõe as regras dedireito público financeiro, exigindo a observância aos princípios de legalidade,impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.

Noutras palavras, as emendas parlamentares devem serfiscalizadas como quaisquer outros gastos públicos e devem, em seu processode indicação e utilização, observar todos os preceitos relacionados ao direitopúblico.

Parafraseando Margareth Thatcher, “Não existe dinheiro público.Todo dinheiro arrecadado pelo governo é tirado do orçamento doméstico, damesa das famílias.”, logo, independente da forma de indicação ou gasto, é imprescindível que os parlamentares e os órgãos de controle observem osmelhores parâmetros de governança para indicação das emendasparlamentares, sob pena de desvirtuar os objetivos de tal prática e desobedeceraos princípios da despesa pública.

 

 

 

 

Por Guilherme Antonio Maluf é graduado em Medicina e conselheiro do Tribunal de Contas de Mato Grosso (TCE-MT).

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