A agenda econômica de 2023 apresentou limitações significativas, refletindo uma abordagem que priorizou a estabilidade fiscal. Escreve Leonardo Roesler.
10/01/2024 06:37
“A política de desoneração da folha de pagamentos tem potencial para estimular o emprego, mas carece de uma visão de longo prazo”
O ano de 2023 foi marcado por propostas de mudanças quanto à conjuntura econômica do país. No total, oito itens da pauta econômica tiveram impacto nas contas do governo: a reforma tributária, os projetos do novo arcabouço fiscal, as mudanças no Carf, a desoneração da folha de pagamentos, a taxação dos fundos exclusivos/offshores, as apostas esportivas, a MP da Subvenção e a Lei de Diretrizes Orçamentárias.
Ao analisar criticamente as políticas econômicas e tributárias implementadas pelo governo brasileiro, é possível observar a discrepância entre as expectativas iniciais e os resultados efetivamente alcançados, particularmente do ponto de vista do empresariado brasileiro. Embora o ano tenha sido marcado por uma série de reformas e iniciativas, muitas delas falharam em atender às necessidades e expectativas do setor empresarial, levantando questões sobre a eficácia das políticas adotadas.
A promessa de simplificação do sistema tributário, por exemplo, permaneceu em grande parte não realizada. A complexidade e a lentidão no processo legislativo, juntamente com a resistência de setores específicos, frustraram as expectativas de uma reforma tributária abrangente que poderia aliviar a carga fiscal das empresas e estimular o crescimento econômico.
No que diz respeito à política fiscal, as medidas de austeridade adotadas pelo governo, embora necessárias para a estabilidade fiscal, foram vistas por muitos no setor empresarial como insuficientes e até contraproducentes. A redução nos gastos públicos, particularmente em áreas como infraestrutura, teve um impacto negativo na economia, limitando as oportunidades de negócios e o potencial de crescimento.
A expectativa de uma política econômica que favorecesse o comércio internacional e atraísse investimentos estrangeiros também não foi plenamente atendida. Apesar de esforços para fortalecer as relações comerciais e participar de fóruns econômicos globais, o progresso foi limitado. A percepção de instabilidade política e a falta de uma estratégia econômica clara e coerente desencorajaram o investimento estrangeiro, deixando o Brasil atrás de seus pares internacionais.
A reforma tributária, por exemplo, apesar de necessária, tem sido criticada por não abordar adequadamente a questão do equilíbrio fiscal. A ênfase parece estar na reestruturação da arrecadação sem uma atenção proporcional à redução de gastos. Essa abordagem pode resultar em uma reforma que, embora modernize o sistema tributário, falha em enfrentar o problema fundamental do desequilíbrio fiscal do país.
No projeto do novo arcabouço fiscal também se percebeu essa tendência. Apesar da iniciativa ter como objetivo declarado de promover a sustentabilidade das contas públicas, ela se concentrou mais em elevar a receita do que em otimizar ou reduzir os gastos governamentais. Enquanto esse enfoque traz alívio imediato às finanças, falha em abordar a questão crítica do elevado gasto governamental, que continua sendo um dos principais desafios fiscais do Brasil.
Nas mudanças aplicadas no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), observa-se uma ênfase excessiva na maximização da arrecadação fiscal, em vez de focar na promoção de justiça tributária equânime e transparente. Essa abordagem pode criar um ambiente de negócios menos confiável e desencorajar investimentos. Ao priorizar a arrecadação sobre a resolução justa e equilibrada de disputas, o governo pode estar inadvertidamente comprometendo a confiança no sistema tributário, um elemento vital para um ambiente de negócios saudável.
A política de desoneração da folha de pagamentos tem potencial para estimular o emprego, mas carece de uma visão de longo prazo. A redução de receitas, sem cortes correspondentes nos gastos, agrava o desequilíbrio fiscal. Por isso, essa medida, embora popular, levanta questões sobre sua sustentabilidade a longo prazo, especialmente considerando o contexto de déficits fiscais crônicos e dívida pública crescente do Brasil. Sem uma estratégia clara para equilibrar as contas públicas, a desoneração pode ser vista como uma solução temporária, mas não uma cura para os problemas fiscais estruturais do país.
Quanto à taxação de fundos exclusivos e offshores, por mais que a medida seja justificável sob a perspectiva de equidade fiscal, ela parece ser mais uma tentativa de aumentar a arrecadação do que de reformar o sistema tributário de maneira mais abrangente e justa. Essa estratégia é potencialmente eficaz em termos de aumentar as receitas fiscais a curto prazo, no entanto, pode ter efeitos adversos na competitividade do mercado financeiro brasileiro e na atração de investimentos estrangeiros. A ênfase excessiva na arrecadação pode impactar negativamente o desenvolvimento econômico.
A regulamentação das apostas esportivas, por outro lado, introduz uma nova fonte de receita tributária; contudo, parece ter sido impulsionada principalmente pela perspectiva de novas receitas, sem uma consideração adequada dos possíveis impactos sociais e econômicos dessa indústria. A falta de uma abordagem holística, que equilibre a geração de receita com considerações sobre o bem-estar social e os impactos econômicos, pode ser uma falha dessa política.
Já a MP da Subvenção introduz subsídios que podem distorcer o mercado e comprometer ainda mais o equilíbrio das contas públicas. Embora esses subsídios possam ser vistos como um estímulo a setores estratégicos, eles também representam um custo fiscal significativo. Sem uma gestão cuidadosa, eles podem levar a ineficiências econômicas e a um aumento do déficit fiscal, contrariando os princípios de uma política fiscal responsável.
E por fim, e não menos importante, a Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2023 tem sido criticada por sua falta de medidas concretas para reduzir os gastos governamentais. Concentrando-se mais em definir limites para o crescimento dos gastos do que em propor cortes efetivos, essa lei falha em abordar a questão fundamental do gasto governamental excessivo. Sem um compromisso firme com a redução de gastos, a LDO corre o risco de se tornar um instrumento de gestão fiscal ineficaz.
Em conclusão, a agenda econômica de 2023 apresentou limitações significativas, refletindo uma abordagem que priorizou a estabilidade fiscal em detrimento de um crescimento econômico mais vigoroso. Olhando para o futuro, é essencial que o governo revise sua estratégia, incorporando políticas que promovam não apenas a estabilidade, mas também o crescimento e a inovação, essenciais para o desenvolvimento sustentável do Brasil.
Por Leonardo Roesler, advogado tributário e empresarial, com especialização em Direito Tributário, é bacharel em Administração mestre em Administração e Finanças pela Ohio University.